terça-feira, 25 de outubro de 2016

Inclusão através da mídia à nível global

Fonte: http://www.inclusive.org.br/arquivos/29782

Foi lançada dia 03 de outubro de 2016, na ONU, em Genebra, uma iniciativa global para promoção da inclusão das pessoas com deficiência através da mídia.
O lançamento ocorreu durante evento do Forum Social 2016, organizado pelo Alto Comissariado de Direitos Humanos, no Palácio das Nações.

Criada pela cofundadora do Movimento Down, Patricia Almeida, a australiana Catia Malaquias, e a americana, Beth Haller, a GADIM – Global Alliance for Disability in Media and Entertainment (Aliança Global para Inclusão das Pessoas com Deficiência na Mídia e no Entretenimento), já tem uma equivalente nacional, a GADIM Brasil, que foi lançada antes das Paralimpíadas.

A intenção é, não só aumentar, como qualificar a presença de pessoas com deficiência na mídia. “Certamente a invisibilidade melhorou, em especial depois dos Jogos”, disse Patricia, “mas ainda é comum ver matérias onde a abordagem é de coitadinho, ou de super herói. Essas representações só contribuem para reforçar esteriótipos que levam à discriminação. Além disso, as pessoas com deficiência não se reconhecem nesses papéis”.” Por outro lado”, disse,”o Brasil tem boas práticas a mostrar na área de merchandising social em novelas”.

Convidada para apresentar a experiência, a Diretora de Responsabilidade Social da TV Globo, Beatriz Azeredo, mostrou clipes de programas e novelas, como por exemplo Páginas da Vida, que contou a história de uma menina com síndrome de Down, a Clarinha, vivida pela atriz Joana Mocarzel. A novela, que foi um marco na transição para a educação inclusiva no país, teve a colaboração do Instituto MetaSocial, representado no evento por Helena Werneck e Patricia Heiderich. Segundo Azeredo, a organização, que tem mais de 20 anos, é uma das mais antigas parceiras da emissora. Azeredo citou ainda a parceria com o Movimento Down para realização da série “Qual a Diferença”, sobre pessoas com síndrome de Down apresentada, por Breno Viola e Drauzio Varela no Fantástico.

A jornalista argentina Veronica Carolina Gonzalez, jornalista da TV argentina, que é cega e faz parte dos Conselho Consultor da GADIM, contou que quando começou a trabalhar no canal Visión 7 tinha uma coluna sobre deficiência separada, mas que agora ela já integra o telejornal que, a seu ver, é uma forma de inclusão.

Cofundadora da GADIM, Catia Malaquias, citou pesquisa que revela que há menos de 1% dos personagens com deficiência na TV americana, sendo que outro estudo aponta que, em 95% dos casos, os personagens são interpretados por atores sem deficiência. Na Austrália, através de sensibilização, Catia conseguiu que grandes redes de lojas como a Target e o KMart começassem a usar modelos com deficiência em seus catálogos e publicidade.

“Muitas dessas ações que levantamos, como inserção de modelos com deficiência na propaganda governamental, por exemplo, não custam muito e podem ser replicadas em outros países”, disse Patricia, que convidou interessados a participar da rede a entrarem em contato para troca de experiências e capacitação.

Participaram do painel a Secretária Nacional de Promoção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, Roseane Cavalcante de Freitas Estrela, Rosangela Berman-Bieler, Assessora Sênior do Unicef, o assessor do Alto Comissariado dos Direitos Humanos, Facundo Chávez, entre outros.


Para colaborar com as iniciativas
info@gadim.org
brasil@gadim.org

Lançada na ONU iniciativa para promover a inclusão das pessoas com deficiência através da mídia


Fonte: http://www.inclusive.org.br/arquivos/29803

A brasileira Patricia Almeida, fundadora da GADIM (Aliança Global para Inclusão das Pessoas com Deficiência através da Mídia e do Entretenimento), participou da Programação oficial do Forum Social 2016, na ONU, em Genebra, falando do papel da mídia no painel sobre a Implementação da Agenda 2030 à luz da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: O Futuro que Queremos. Ela defendeu a utilização dos meios de comunicação para desconstrução de esteriótipos e da cultura capacitista reinante, que considera pessoas com deficiência como tendo menos valor do que pessoas sem deficiência.
 A fundadora da GADIM citou como exemplos positivos de marketing social as novelas que incluem personagens com deficiência, construídos em parceria com organizações de pessoas com deficiência, e destacou a novela “Páginas da Vida”, da TV Globo, que, segundo ela, contribuiu para um avanço na transição do sistema de educação especial para a educação inclusiva. Ela concluiu chamando os países a cumprirem o Artigo 8 da Convenção, sobre Conscientização, que prevê a participação da mídia para a garantia dos direitos das pessoas com deficiência.
Catia Malaquias, cofundadora da GADIM e fundadora da Starting with Julius, organização que promove a inclusão de modelos com deficiência na publicidade na Australia, falou sobre a importância das pessoas com deficiência serem vistas como consumidoras, funcionárias e prestadoras de serviço.
Na conclusão do painel, Patricia Almeida convocou o movimento social dos diferentes países a cobrar de seus governos medidas concretas em cumprimento do Artigo 8. Ela afirmou a cultura vigente gera discriminação e barreiras que impedem que outros artigos importantes da Convenção sejam cumpridos, e a inclusão na mídia de maneira positiva tem o poder de acelerar o processo de mudança cultural.

Pacto pela inclusão precisa sair do papel!


Fonte: http://brasil.estadao.com.br/blogs/vencer-limites/grandes-empresas-firmam-pacto-para-inclusao-de-pessoas-com-deficiencia-no-mercado-de-trabalho-no-brasil/



Antonio Salvador (Grupo Pão de Açucar – GPA), Christiane Berlinck (IBM), Beatriz Sairafi Heinemann (Accenture), Maria Elisa Gualandi Verri (TozziniFreire Advogados), José Luiz Rossi (Serasa Experian), Fábio Maceira (JLL), Alexandre Espinosa (Natura), Roberto Martorelli (EY) e Osvaldo Kalaf (Dow) assinaram a carta. Foto: Divulgação

A assinatura da carta de adesão ao Pacto pela Inclusão de Pessoas com Deficiência foi o momento central do 24º encontro da Rede Empresarial de Inclusão Social, realizado nesta quinta-feira, 20 de outubro de 2016, na zona sul de São Paulo.
Accenture, Dow, EY, GPA (Grupo Pão de Açucar), IBM, JLL (Jones Lang LaSalle), Natura, Serasa Experian e TozziniFreire Advogados firmaram o compromisso, estendido a todas as corporações participantes da iniciativa que nasceu em 2012.
O documento estabelece metas e diretrizes para promover uma cultura interna e um ambiente inclusivo e acessível nas empresas, cria um diagnóstico e o monitoramento do progresso das organizações para a inclusão, além de avaliar constantemente o interesse genuíno das empresas envolvidas em cumprir os compromissos assumidos.
A carta assinada tem a chancela da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que não mantém um órgão oficial no Brasil, mas delegou à Rede Empresarial de Inclusão a autoridade para liderar esse trabalho no País.
“Este é um momento de mudança do patamar de desenvolvimento da Rede”, afirmou
Esteban Tromel, Senior Disability Specialist da OIT, que participou do evento por meio de videoconferência.

Abaixo, a íntegra da Carta de Adesão ao Pacto pela Inclusão de Pessoas com Deficiência.
Considerando os princípios, leis e normas de respeito aos direitos das pessoas com deficiência, sobretudo, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Convenção da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a Lei Brasileira de Inclusão e a Carta de Compromisso da Rede Global de Empresas e Deficiência da OIT (Charter Principles – ILO Global Business and Disability Network),
Reconhecendo que a deficiência é um conceito em evolução e que é resultado da interação com diversas barreiras, obstruindo a participação plena e efetiva das pessoas com deficiência na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas,
Considerando que a discriminação baseada na deficiência, configura violação da dignidade e do valor inerente ao ser humano,
Reconhecendo a importância da acessibilidade em todas as suas dimensões, para possibilitar as pessoas com deficiência o pleno exercício de seus direitos, inclusive da liberdade para fazer suas próprias escolhas,
Considerando que é responsabilidade de todas as pessoas e organizações promover o direito à igualdade, à liberdade, ao acesso a oportunidades, bem como trazer questões relativas à deficiência para a criação de estratégias relevantes de desenvolvimento sustentável ao negócio,
Ressaltando que é responsabilidade também das empresas, uma vez que estas possuem importante papel na promoção do respeito à todas as pessoas,
A Rede Empresarial de Inclusão Social estabelece o Pacto pela Inclusão de Pessoas com Deficiência e define seus compromissos pela Promoção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, sendo eles:
1. Comprometer a alta liderança com o respeito e a promoção dos direitos das Pessoas com Deficiência.
2. Desenvolver políticas e procedimentos com vistas às ações afirmativas em todos os âmbitos da organização.
3. Promover cultura e ambiente inclusivos e acessíveis a todas as pessoas com deficiência.
4. Comunicar e educar para o respeito dos direitos e deveres das pessoas com deficiência.
5. Incluir a questão da deficiência na estratégia da empresa, bem como no planejamento de produtos, serviços e atendimento a clientes.
Portanto, ao aderirmos ao Pacto pela Inclusão de Pessoa com Deficiência, expressamos:
a) Nosso interesse em cumprir com os compromissos, mesmo que ainda não estejamos atendendo com toda a agenda proposta;
b) Nossa responsabilidade em diagnosticar e monitorar o progresso da empresa no que diz respeito à inclusão das pessoas com deficiência;
c) Nosso engajamento e posicionamento formal e público, evidenciando o compromisso com os direitos das pessoas com deficiência.
Desta forma, eu __________________________, representando a empresa ___________________________, assino o Pacto pela Inclusão de Pessoa com Deficiência, expressando nosso compromisso em implementar estes princípios e ações propostas.
Local, ___ de __________________ de ______.
_____________________________________________
[Nome Completo]
[Cargo *CEO/Diretor]
ANEXO 1
Descrição dos 5 Compromissos da Empresa pela Inclusão das Pessoas com Deficiência
1. Comprometer a alta liderança com o respeito e a promoção dos direitos das Pessoas com Deficiência.
A alta liderança deve:
Envolver-se nas ações de inclusão das pessoas com deficiência.
Disseminar, respeitar e assegurar os direitos das pessoas com deficiência em documentos, processos e políticas.
Conter e repudiar situações de discriminação.
Promover uma cultura de inclusão e de valorização da diversidade.
Considerar os termos do Pacto ao estabelecer parcerias com outras empresas e organizações.
Fomentar o engajamento de toda cadeia de valor na temática da inclusão da pessoa com deficiência.
2. Desenvolver políticas e procedimentos com vistas às ações afirmativas em todos os âmbitos da organização.
Criar política e ações de combate à discriminação.
Equiparar oportunidades e salários.
Garantir um processo seletivo focado no potencial e não na limitação.
Implementar plano de desenvolvimento e carreira.
Estimular para que a liderança tenha metas de contratação de pessoas com deficiência.
Possibilitar autonomia e empoderamento.
Fomentar a contratação de pessoas com deficiência severa e reabilitados.
3. Promover cultura e ambiente inclusivos e acessíveis a todas as pessoas com deficiência.
Garantir acessibilidade em todas as suas dimensões: atitudinal, metodológica, instrumental, comunicacional, arquitetônica, programática e natural (se aplicável).
Priorizar o uso do conceito de desenho universal para instalações, serviços e produtos.
Considerar o conceito de adaptação razoável e tecnologias assistivas para assegurar o tratamento justo e igualitário.
Disseminar o conhecimento sobre acessibilidade para toda a organização.
4. Comunicar e educar para o respeito dos diretos e deveres das pessoas com deficiência.
Desenvolver e acompanhar comunicações (internas e externas) promovendo a inclusão e evitando a discriminação.
Definir uma agenda positiva para a promoção da inclusão.
Garantir que o valor à diversidade esteja em todos os programas de desenvolvimento de pessoas na empresa.
Disseminar o valor à diversidade para todos os públicos de interesse da organização.
5. Incluir a questão da deficiência na estratégia da empresa, bem como no planejamento de produtos, serviços e atendimento a clientes.
Tornar a questão da deficiência como valor da empresa e direcionar as tomadas de decisão com base no respeito aos direitos da pessoa com deficiência.
Desenvolver canais de atendimento acessíveis para pessoas com deficiência.
Repudiar atos de discriminação, preconceitos e estereótipos.
Criar canais de diálogo e garantir a participação das pessoas com deficiência para decisões que as envolvem.
Incentivar, criar e/ou elaborar produtos, serviços, equipamentos e instalações que garantam a inclusão das pessoas com deficiência.

Inclusão de profissionais com deficiência está longe de acontecer!!!


Dois a cada 3 trabalhadores com deficiência têm Ensino Médio Completo ou mais, mas a invisibilidade continua

As empresas brasileiras iniciaram o ano com 403.255 trabalhadores com deficiência contratados, no setor público e privado. Este número representa menos de 1% dos 48,06 milhões de trabalhadores.
Os registros indicam que a cada 3 trabalhadores com deficiência, dois têm ensino médio ou mais e para cada analfabeto empregado há 18 com educação superior completa.

04-diplomasPelo lado da remuneração as diferenças variam de R$ 1.139,01 como remuneração média aos trabalhadores com deficiência intelectual, e, os reabilitados, geralmente acidentados no próprio trabalho, recebem remuneração média de R$ 3.066,80. A remuneração média dos trabalhadores com deficiência é de R$ 2.656,94 mas as variações são gritantes dependendo do tipo de deficiência, onde nos exemplos citados o primeiro grupo recebe 57,1% a menos que a média e o segundo grupo 15,6% acima da mesma média.

Para vencer mitos que ainda impedem o pleno emprego destes trabalhadores e discutir a utilização da CIF – Classificação Internacional de Funcionalidade e Saúde como ferramenta para ampliar a inclusão, o Espaço da Cidadania incluiu o debate destes assuntos em seu 9º Encontro Anual, que está com inscrições abertas.

·         Dia: 24/11/2016
·         Horário: 9h00 às 13h30
·         Local: Ministério Público do Trabalho – 2ª Região
·         Endereço: Rua Cubatão, 322 – Paraíso – São Paulo (Próximo à estação Paraiso do Metrô)

Para efetuar a inscrição é necessário informar os seguintes dados: Nome completo, RG, Empresa/Entidade, Cidade, Telefone e E-mail.

As inscrições gratuitas podem ser feitas até 16/11/2016 através do e-mail ecidadania@ecidadania.org.br Oportunamente as pessoas inscritas receberão a programação definitiva e orientações.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Acessível para quem e qual o papel dos jornalistas na mídia inclusiva




Como é ser jornalista com deficiência hoje.

Por Leandra Migotto Certeza*

Conclui a minha graduação em 1999, (em uma das maiores capitais do país), trabalhei mais de 15 anos atuando em mídias segmentadas, e quando realizei uma palestra, dia 21 de outubro de 2016, para futuros comunicadores, na UNESP – Universidade Estadual Paulista de Baru, constatei que pouco mudou em relação à imagem das pessoas com deficiência na mídia, e principalmente, sobre o processo de acessibilidade e inclusão nas universidades.  

Uma das primeiras perguntas dos alunos curso de Lato Sensu no módulo de Especialização “Linguagem, Cultura e Mídia” foi: “como você vê a inserção profissional de jornalistas com deficiência que não tiveram as mesmas oportunidades do que você”.  Eu já havia respondido a esta questão, em uma crônica que escrevi e enviei para eles antes daquela noite. Minhas palavras foram:

“A maioria das 45 milhões de pessoas com deficiência no Brasil ainda vivem em situação de pobreza, sem nenhum recurso garantido por parte do Estado. Muitas ainda estão trancadas dentro de suas casas, presas em uma cama, sem possibilidade de conquistar seu direito ao trabalho, totalmente marginalizadas. E isso está acontecendo agora. Graças à minha família, tive condições de dispor de um bom tratamento, de fazer faculdade, conquistar autonomia. A maior parte dos jornalistas com deficiência também compartilha desta condição financeira mais estável do que a maioria. Por esse motivo é tão difícil encontramos jornalistas com deficiência que são de origem pobre, simplesmente porque as pessoas de classe social mais baixa ainda não tiveram condição de cursar faculdade. Ou quando tem a oportunidade ainda são barrados nas redações de emissoras de TV, revistas, jornais e rádios, por puro preconceito e discriminação”.

Durante duas horas que falei com o Grupo de Pesquisa “Mídia Acessível e Tradução Audiovisual” abordei a importância da mídia inclusiva acessível em nossa sociedade. Contei um pouco da minha trajetória como estudante em escolas totalmente excludentes ou bem pouco inclusivas, e depois como jornalista desde 1998, quando comecei a escrever reportagens sobre variados temas, relacionados ao cotidiano das pessoas com deficiência em mídias segmentadas e alguns trabalhos em mídias abertas. Também fui convidada para ser entrevistada em dois programas da TV UNESP e contar um pouco sobre a minha vida e carreira profissional, e também, sobre o conceito da deficiência como parte da condição humana diversa de todos os seres.

Mas esta história começou um mês antes, quando recebi uma mensagem da professora Prof. Dra. Lucinéa Marcelino Villelacoordenadora do curso, me convidando para realizar a atividade. Foi preciso uma ‘força tarefa’ para viabilizar minha viagem e estadia. Apenas um hotel na cidade de Bauru tem só três quartos adaptados para pessoas com deficiência. E mesmo assim, ainda não está totalmente adequado para quem usa cadeira de rodas, e não tem nenhum sinal de acessibilidade para quem não enxerga com os olhos ou não escuta com os ouvidos. Ônibus rodoviários com plataformas elevatórias ou rampas também é outro sonho bem longe de se tornar realidade. Simplesmente não existe nenhum no Brasil inteiro! E ironicamente, todos se orgulham de ter o símbolo internacional de acesso estampado bem grande na janela da frente. Pura propaganda enganosa!

Quando eu cheguei na rodoviária de Bauru, não haviam táxis acessíveis, apesar de um taxista afirmar que existe dois na cidade. Já antes, na cidade de São Paulo, para ir da minha casa até a rodoviária, utilizei um carro de transporte por aplicativo porque os poucos táxis acessíveis são mais caros e precisam ser agendados com bastante antecedência, e mesmo assim costumam falhar (eu quase perdi um vôo esperando um táxi acessível mais de uma hora). Caso não tivesse a grande ajuda do meu marido e a colaboração dos motoristas, não seria viável realizar este trabalho, pois nem sairia de casa.

Mas os ‘perrengues’ estavam só começando... Para subir e descer dos dois ônibus que viajamos (contanto ida e volta) foi preciso pedir ajuda mais uma vez. Agora não apenas para o meu marido, mas para garotos bem fortes que também iriam para o mesmo destino. Sem os braços deles e, principalmente, a enorme boa vontade e solidariedade (além da gentileza das esposas, pois os meninos me carregaram no colo), eu não teria embarcado, e muito menos conseguido viajar com tranqüilidade, porque foi preciso fazer uma parada estratégica para o xixi.

Confesso que é bom despertar a solidariedade nas pessoas, mas se locomover com independência é muito melhor! Simplesmente, não entendo porque todas as inúmeras leis internacionais, nacionais, estaduais e municipais em relação à acessibilidade não são cumpridas pelas empresas de ônibus e muito menos pelas Prefeituras e Estados no Brasil. É uma vergonha! Eu e outros vários profissionais com deficiência pagamos impostos, somos cidadãos, temos direitos e deveres, mas não somos respeitados ainda em pleno século 21.  

Será que as mais de 100 matérias que escrevi ao longo da minha carreira, e a maioria delas denúncias, não serviram de nada para conscientizar os governantes e empresários... Creio que muito ainda precisar ser feito para que os profissionais com deficiência, jornalistas ou não, sejam vistos como seres humanos que precisam conseguir viver com autonomia em uma sociedade verdadeiramente inclusiva! 

O relato de uma estudante que assistiu a minha palestra no auditório (também pouco acessível da faculdade) é a constatação que ainda estamos bem longe do que é necessário para não ser mais preciso falar sobre acessibilidade nas escolas. Ela contou que um aluno com deficiência física usuário de cadeira de rodas, quase não conseguiu participar da cerimônia de formatura porque o auditório tinha escadas. Ele estudou em uma faculdade particular de Bauru, e precisou reivindicar o seu direito que receber o diploma junto com demais colegas! 

Exatamente como eu fiz em 1996, quando exigi que adaptassem os banheiros da faculdade em que me formei. E somente em 1999, um deles foi reformado, mas mesmo assim, longe de estar dentro dos padrões internacionais de acessibilidade. Infelizmente, estas histórias de desrespeito e discriminação ainda se repetem com muita freqüência. Por isso, não podemos parar de lutar sempre mais por um mundo melhor hoje e amanhã! Cada um fazendo a sua parte, porque juntos somos mais fortes! Caminhemos...        



Assistam as duas entrevistas que dei para a TV UNESP: 



Professora Lucinéa.


Programa Artefato da TV UNESP de Bauru apresentado pela jornalista Juliana Ramos.

Jornal UNESP Notícias apresentado pela jornalista Larissa Rosseto.



Sobre a palestra a professora Lucinéa escreveu: 
"A jornalista Leandra Migotto Certeza, jornalista de São Paulo, foi convidada pelo grupo MATAV para apresentar a palestra “Acessível para quem?: O papel dos profissionais de comunicação em busca de uma mídia realmente inclusiva” no módulo de Especialização “Linguagem, Cultura e Mídia”, ministrado pela docente Profa. Dra. Lucinéa Villela. 
A palestra ocorreu no dia 21 de outubro com participação dos alunos do curso de Lato Sensu. Durante a palestra, a jornalista e blogueira, que nasceu com uma deficiência rara conhecida como “ossos de cristais”, contou de forma descontraída sua trilha para se formar em Jornalismo e atuar profissionalmente em revistas segmentadas. 
Houve grande participação dos discentes nas duas horas de bate papo com Leandra. Sua batalha de décadas desde sua infância até ser reconhecida no meio profissional serve de exemplo para todas as pessoas com deficiência que possuem um sonho de cursar uma universidade e seguir a profissão de seus sonhos. Além da palestra, a jornalista também deu duas entrevistas na TV UNESP". 
Fonte:
https://matavunesp.wordpress.com/2016/10/31/palestra-de-leandra-migotto-certeza/comment-page-1/#comment-38
*Leandra Migotto Certeza é jornalista por formação, consultora por profissão, e escritora por paixão. Recebeu o Prêmio de Classificação de Excelência no Concurso de "Periodismo y Comunicación Sociedad para Todos" na Colômbia em 2003, pelo artigo sobre educação: "Ser e Estar" (publicado em diversos portais); e o prêmio na categoria pôster sobre o projeto: “Fantasias Caleidoscópicas” (relativo à sexualidade da pessoa com deficiência) durante o "Sexto Congresso Internacional - Prazeres Dês-Organizados Corpos, Direitos e Culturas em Transformação", realizado pela Universidad Cayetano Heredia, em Lima em 2007. 

Acessível para quem e qual o papel dos jornalistas na mídia inclusiva




Como é ser jornalista com deficiência hoje.

Por Leandra Migotto Certeza*

Conclui a minha graduação em 1999, em uma das maiores capitais do país, trabalhei mais de 15 anos atuando em mídias segmentadas, e quando realizei uma palestra, dia 21 de outubro de 2016, para futuros comunicadores, em uma das mais importantes universidades, constatei que pouco mudou em relação à imagem das pessoas com deficiência na mídia, e principalmente sobre o processo de acessibilidade e inclusão nas universidades.  

Uma das primeiras perguntas dos alunos curso de Lato Sensu foi: “como você vê a inserção profissional de jornalistas com deficiência que não tiveram as mesmas oportunidades do que você”.  Minha resposta já havia sido respondida em uma crônica que escrevi e enviei para eles antes daquela noite na UNESP – Universidade Estadual Paulista de Baru para o Grupo de Pesquisa “Mídia Acessível e Tradução Audiovisual” (MATAV), no módulo de Especialização “Linguagem, Cultura e Mídia”, coordenado pela Prof. Dra. Lucinéa Marcelino Villela.

“A maioria das 45 milhões de pessoas com deficiência no Brasil ainda vivem em situação de pobreza, sem nenhum recurso garantido por parte do Estado. Muitas ainda estão trancadas dentro de suas casas, presas em uma cama, sem possibilidade de conquistar seu direito ao trabalho, totalmente marginalizadas. E isso está acontecendo agora. Graças à minha família, tive condições de dispor de um bom tratamento, de fazer faculdade, conquistar autonomia. A maior parte dos jornalistas com deficiência também compartilha desta condição financeira mais estável do que a maioria. Por esse motivo é tão difícil encontramos jornalistas com deficiência que são de origem pobre, simplesmente porque as pessoas de classe social mais baixa ainda não tiveram condição de cursar faculdade. Ou quando tem a oportunidade ainda são barrados nas redações de emissoras de TV, revistas, jornais e rádios, por puro preconceito e discriminação”.

Durante duas horas, abordei a importância da mídia inclusiva acessível em nossa sociedade. Contei um pouco da minha trajetória como estudante em escolas totalmente excludentes ou bem pouco inclusivas, e depois como jornalista desde 1998, quando comecei a escrever reportagens sobre variados temas, relacionados ao cotidiano das pessoas com deficiência em mídias segmentadas e alguns trabalhos em mídias abertas. Também fui convidada para ser entrevistada em dois programas da TV UNESP e contar um pouco sobre a minha vida e carreira profissional, e também, sobre o conceito da deficiência como parte da condição humana diversa de todos os seres.

Mas esta história começou um mês antes, quando recebi uma mensagem da professora Lucélia me convidando para realizar a atividade. Foi preciso uma ‘força tarefa’ para viabilizar minha viagem e estadia. Apenas um hotel na cidade de Bauru tem só três quartos adaptados para pessoas com deficiência. E mesmo assim, ainda não está totalmente adequado para quem usa cadeira de rodas, e não tem nenhum sinal de acessibilidade para quem não enxerga com os olhos ou não escuta com os ouvidos. Ônibus rodoviários com plataformas elevatórias ou rampas também é outro sonho bem longe de se tornar realidade. Simplesmente não existe nenhum no Brasil inteiro! E ironicamente, todos se orgulham de ter o símbolo internacional de acesso estampado bem grande na janela da frente. Pura propaganda enganosa!

Quando eu cheguei na rodoviária de Bauru, não haviam táxis acessíveis, apesar de um taxista afirmar que existe dois na cidade. Antes, na cidade de São Paulo, para ir da minha casa até a rodoviária, utilizei um carro de transporte por aplicativo porque os poucos táxis acessíveis são mais caros e precisam ser agendados com bastante antecedência, e mesmo assim costumam falhar (eu quase perdi um vôo esperando um táxi acessível mais de uma hora). Nas duas voltas, foi a mesma dificuldade. Caso não tivesse a grande ajuda do meu marido e a colaboração dos motoristas, não seria viável realizar este trabalho, pois nem sairia de casa.

Mas os ‘perrengues’ estavam só começando... Para subir e descer dos dois ônibus que viajamos, contanto ida e volta, foi preciso pedir ajuda mais uma vez. Agora não apenas para o meu marido, mas para garotos bem fortes que também iriam para o mesmo destino. Sem os braços deles e principalmente, a enorme boa vontade e solidariedade (além da gentileza das esposas, pois os meninos me carregaram no colo), eu não teria embarcado e muito menos conseguido viajar com tranqüilidade, porque foi preciso fazer uma parada estratégica para o xixi.

Confesso que é bom despertar a solidariedade nas pessoas, mas se locomover com independência é muito melhor! Simplesmente, não entendo porque todas as inúmeras leis internacionais, nacionais, estaduais e municipais em relação à acessibilidade não são cumpridas pelas empresas de ônibus e muito menos pelas Prefeituras e Estados no Brasil. É uma vergonha! Eu e outros vários profissionais com deficiência pagamos impostos, somos cidadãos, temos direitos e deveres, mas não somos respeitados ainda em pleno século 21.  

Será que as mais de 100 matérias que escrevi ao longo da minha carreira, e a maioria delas denúncias, não serviram de nada para conscientizar os governantes e empresários... Creio que muito ainda precisar ser feito para que os profissionais com deficiência, jornalistas ou não, sejam vistos como seres humanos que precisam conseguir viver com autonomia em uma sociedade verdadeiramente inclusiva! O relato de uma estudante que assistiu a minha palestra no auditório pouco acessível da faculdade é a constatação que ainda estamos bem longe do que é necessário para não ser mais preciso falar sobre acessibilidade nas escolas. Ela contou que um aluno com deficiência física usuário de cadeira de rodas, quase não conseguiu participar da cerimônia de formatura porque o auditório tinha escadas. Ele estudou em uma faculdade particular de Bauru, e precisou reivindicar o seu direito que receber o diploma junto com demais colegas!

Exatamente como eu fiz em 1996, quando exigi que adaptassem os banheiros da faculdade que me formei; e somente em 1999, um deles foi reformado, mas longe de estar dentro dos padrões internacionais de acessibilidade. Infelizmente, as histórias ainda se repetem com muita freqüência. Por isso, não podemos parar de lutarmos sempre mais por um mundo melhor hoje e amanha! Cada um fazendo a sua parte, porque juntos somos mais fortes! Caminhemos...        



Assistam uma das entrevistas que dei para a TV UNESP: 

Professora Lucinea.


Programa Artefato da TV UNESP de Bauru apresentado pela jornalista Juliana Ramos.

Jornal UNESP Notícias apresentado pela jornalista Larissa Rosseto.



Sobre a palestra a professora Lucinéa escreveu: 
"A jornalista Leandra Migotto Certeza, jornalista de São Paulo, foi convidada pelo grupo MATAV para apresentar a palestra “Acessível para quem?: O papel dos profissionais de comunicação em busca de uma mídia realmente inclusiva” no módulo de Especialização “Linguagem, Cultura e Mídia”, ministrado pela docente Profa. Dra. Lucinéa Villela. 
A palestra ocorreu no dia 21 de outubro com participação dos alunos do curso de Lato Sensu. Durante a palestra, a jornalista e blogueira, que nasceu com uma deficiência rara conhecida como “ossos de cristais”, contou de forma descontraída sua trilha para se formar em Jornalismo e atuar profissionalmente em revistas segmentadas. 
Houve grande participação dos discentes nas duas horas de bate papo com Leandra. Sua batalha de décadas desde sua infância até ser reconhecida no meio profissional serve de exemplo para todas as pessoas com deficiência que possuem um sonho de cursar uma universidade e seguir a profissão de seus sonhos. Além da palestra, a jornalista também deu duas entrevistas na TV UNESP". 
Fonte:
https://matavunesp.wordpress.com/2016/10/31/palestra-de-leandra-migotto-certeza/comment-page-1/#comment-38
*Leandra Migotto Certeza é jornalista por formação, consultora por profissão, e escritora por paixão. Recebeu o Prêmio de Classificação de Excelência no Concurso de "Periodismo y Comunicación Sociedad para Todos" na Colômbia em 2003, pelo artigo sobre educação: "Ser e Estar" (publicado em diversos portais); e o prêmio na categoria pôster sobre o projeto: “Fantasias Caleidoscópicas” (relativo à sexualidade da pessoa com deficiência) durante o "Sexto Congresso Internacional - Prazeres Dês-Organizados Corpos, Direitos e Culturas em Transformação", realizado pela Universidad Cayetano Heredia, em Lima em 2007. 

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Cadê a jornalista?




Por Leandra Migotto Certeza*

Comecei a graduação em Produção Editorial, na Universidade Anhembi Morumbi em São Paulo, no ano de 1996, aos 19 anos. Sempre tive paixão pela reportagem e o sonho em ser jornalista. A vocação e o talento sempre foram mais fortes; e eu segui os passos que o meu coração trilhou. Aprendi a fazer reportagens, entrevistar, e editar os meus próprios textos, na marra e sozinha! Nunca tive aulas técnicas sobre como redigir um bom texto. Mas modéstia parte, sempre sabia onde queria chegar e conseguia bons resultados porque estudava bastante, lia mais ainda, e metia a cara com muita coragem e determinação. Logo no terceiro ano da faculdade publiquei minha primeira reportagem, em uma das primeiras revistas segmentadas voltadas para as pessoas com deficiência.
Procurei a redação da revista por iniciativa própria. Primeiro telefonei para o número que estava na publicado e pedi para falar com o editor. Ele mesmo atendeu e disse que ficava contente com a participação dos leitores. Então, eu expliquei que não queria ser apenas uma leitora, e sim uma das jornalistas. Ele sorriu e disse que a equipe era bem reduzida e a revista era feita na própria casa dele. Eu insisti que precisava conhecer a redação e apresentar uma proposta de reportagem. Ele aceitou na hora e foi muito simpático.  

Lembro que no dia da visita eu estava bem nervosa. Fui toda arrumada e com a minha melhor roupa. Minha mãe me levou de carro, como sempre fez durante todas as minhas primeiras atividades, antes de eu perder o medo de sair sozinha de táxi pelas ruas da cidade. Quando cheguei onde a revista era feita, levei um susto: havia degraus bem na entrada! Pensei: “como uma revista que fala sobre inclusão pode ser assim”... É como diz o ditado: “em casa de ferreiro o espeto é de pau”. Ainda bem que eu ainda andava de muletas e consegui com dificuldade subir os degraus.
Naquela tarde de 1998, que passei ao lado do editor das primeiras revistas de São Paulo, voltadas para o público com deficiência, percebi o quanto o processo de inclusão ainda caminhava e quantos degraus seria preciso subir para alcançarmos a visibilidade do potencial de profissionais de comunicação com deficiência. Ainda vivíamos uma época em que muitos dos projetos voltados às pessoas com deficiência ainda estavam intimamente ligados às instituições, que em sua grande maioria tinha uma visão extremamente assistencialista, ou às experiências de familiares dessas pessoas, o que era o caso desta revista.
O editor tinha um filho com deficiência e sua esposa era dentista. Mas lembro também da linha editorial inovadora da publicação, que vinha do envolvimento político e do ativismo social dele em outros movimentos. Esse foi o lado que mais me apaixonou e despertou em mim a chama forte de luta por um mundo mais justo e solidário, em que todas as pessoas conseguissem mostrar o tamanho do seu potencial, independente de sua deficiência e condição social.         
É claro que também fiquei encantada com a produção de uma revista de verdade! Nossa... Como meus olhos brilharam quando vi as telas dos computadores com cada página da revista sendo diagramada. Quantas cores… Quantas imagens… Emocionante… Era isso o que eu sonhava em fazer: trabalhar em um lugar exatamente como esse, cheirando a criação! Fechei os olhos e fiquei me imaginando ali, dando pitaco em tudo… E depois chegando até a redação com a minha pastinha nas mãos, gravador e a máquina fotográfica com notícias quentinhas dos vários eventos em que iria estar para contar aos meninos e meninas colegas de trabalho sobre as minhas aventuras, os fatos e as histórias que eu havia encontrado… Um novo mundo se abriu para mim, e como era bom sonhar…
Bom, mas infelizmente, como o editor havia dito, a sua equipe era muito pequena e não havia dinheiro para novas contratações. E o pior de tudo, a revista estava passando por graves dificuldades econômicas, afinal, não era financiada por governos e não tinha rabo preso com alguma instituição.
Confesso que fiquei bem triste e preocupada, mas o que fez meus olhos brilharem foi saber que o sonho em criar uma publicação totalmente isenta de pressões políticas, ou visões retrógradas que colocavam às pessoas com deficiência como meros fins para se ganhar dinheiro, era o que sustentava cada palavra, foto ou imagem da revista. Pena que esta publicação conseguiu ter uma vida curta, mas a qualidade de suas reportagens e o pioneirismo em isenção marcou a história das mídias voltadas para esse público, como uma das mais conceituadas e inesquecíveis.
Em todos os lugares em que já trabalhei, não entrei por conta de indicações, mas porque eu ia até os locais, deixava meus currículos à disposição, oferecia uma cobertura gratuita de um evento e perguntava - na maior cara de pau - se eu poderia fazer parte da equipe. Até que finalmente, no ano 2000, eu comecei a escrever para outra importante revista mensal segmentada, voltada para a inclusão de pessoas com deficiência.

Uma das reportagens que fiz, nesta época, e mais me marcou foi quando descobri que alguns motoristas de uma empresa de transportes estavam realizando um treinamento de como auxiliar no embarque e desembarque de pessoas com deficiência sem a presença de ninguém nessa condição. Vi que estavam inventando tudo da cabeça deles, sem respei­tar norma alguma. Descobri isso através de alguns contatos e avisei muitas pessoas de diversas instituições e organizações representativas sobre a situ­ação. Decidimos aparecer no local do treinamento de surpresa e exigimos acompanhar tudo o que estava sendo feito. Fui com a equipe da revista em que trabalhava na época, e fizemos uma grande reportagem bem crítica e de denúncia.

Ter trabalhado nesta revista, foi uma experiência mais significativa da minha carreira, e os anos da minha vida em mais produzi com muita paixão e gigantesca dedicação. Realizei mais 50 coberturas de eventos em apenas 2 anos. Às vezes perguntava antes se o local era acessível, em outras, aproveitava para dar uma de fiscal. Fazia um cadastro prévio nas assessorias de imprensa sem avisar que tinha uma deficiência. Isso era de propósito porque queria ver a reação das pessoas ao encontrar uma jornalista na minha condição. Quando eu entrava nesses locais, muitas das pessoas diziam: “Cadê a jornalista que falou que viria?” E quando eu respondia que eu era a jornalista, muitas pessoas ficavam bem surpresas.

Apesar dos profissionais da mídia parecer estar acostumados a tratar do assunto, na maioria das vezes era um discurso sobre o outro, construído de uma forma assistencialista, estigmatizada e até piegas. Era o discurso de quem não tem deficiência e vê o outro em condição de suposta fragilidade, de desvantagem. Por isso considero tão importante o lema do movimento das pessoas com deficiência a partir da década de 1980, conhecido como “Nada sobre nós sem nós”. Essa frase simples traduz uma necessidade absoluta de qualquer movimento social ou organização que lute por igualdade de oportunidades: a de se garantir representatividade.   

Já em 2010, fui Jornalista Responsável por outra publicação em uma nova editora. Desta vez era voltada para Educação Inclusiva. Tive que visitar uma escola que tinha alguma acessibilidade, mas também várias inadequações. Não que estivesse maquiando algo, mas precisei olhar para as qualidades da escola, valorizar os alunos com deficiência que estudavam lá, ao invés de mostrar os problemas nos padrões de acessibilidade. Esse tipo de situação me causou um pouco de frustração com a profissão, mas nunca cheguei ao ponto de pensar em desistir. Durante toda a carreira, gostava de cumprir qualquer pauta que me pedissem, exceto nas raras vezes em que tive que fazer matérias pagas, ou seja, somente porque algum anunciante encomendava. Não tinha muita escapatória, apesar de não concordar com a prática, eu precisava trabalhar.

Por ter trabalhado na maior parte do tempo em revistas pequenas, com número reduzido de funcionários, não utilizei a lei de cotas para pessoas com deficiência. Uma das poucas exceções foi quando consegui uma vaga para Atendimento ao Leitor em uma das maiores editoras de revistas do Brasil, em 2006. Decidi aceitar o emprego porque tinha a esperança de ser transferida para a área editorial depois de um tempo, mas apesar das minhas muitas solicitações, isso não ocorreu. Mesmo eu formada desde 1999, e com importante experiência como repórter de revista, não tive oportunidade de evoluir dentro da empresa porque estava lá apenas cumprindo cota. Larguei o emprego por esse motivo, mas considero a lei de cotas um importante instrumento de inclusão, apesar de considerar que precisa de aprimoramentos.

Em relação às pessoas com deficiência que trabalham como jornalistas, eu considero importante reforçar que grande parte da mídia ainda se prende a padrões estéticos de uma maneira forte e, por conta disso, muita gente com deficiência tem dificuldade de se inserir no mercado. Aliás, isso não ocorre apenas com as deficiências, mas ainda hoje vemos pouquíssimos jornalistas negros, orientais, de etnias diversas ou com qualquer outra característica que demonstre diferença ocupando colocações de destaque, exercendo função de apresentadores, mostrando seus rostos e corpos.

Até pouco tempo atrás, muitas emissoras de televisão não contratavam pessoas que usassem óculos, para se ter uma ideia. Nos dias atuais, em que temos uma cultura muito visual, a aparência se tornou fundamental, às vezes mais do que a qualificação profissional, infelizmente. Por isso é importante que questionemos, com os instrumentos que temos à disposição, esse tipo de comportamento. Alguns dos instrumentos que utilizo para problematizar essa e muitas outras questões são meus dois blogs, o Caleidoscópio e o Fantasias Calei­doscópicas. O primeiro, eu uso para contar sobre tudo, meu dia a dia, as entrevistas que fizeram comigo, alguns textos literários e outros conteúdos de caráter jornalístico. O outro blog se destina a tratar da sexualidade da pessoa com deficiên­cia, um tema que é muito importante. Faço palestras sobre o assunto e já produzi um ensaio fotográfico sensual junto com a fotógrafa e amiga Vera Albuquerque.

Acho que nunca fui muito atrás de colaborar com jornais impressos justamente porque prefiro de um tipo de escrita mais demorada, com mais tempo para refinamento da linguagem. Ficava apreensiva com o ritmo acelerado das publicações diárias, talvez por isso tenha me focado na produção de revistas. Sempre me interessei por reportagens com caráter social, que proble­matizassem as dificuldades das minorias, das populações que sofrem com preconceito e discriminação. Negros, mulheres, comunidade LGBT, pesso­as de baixa renda ou com deficiência. Acredito que essa busca por denunciar as desigualdades está no meu sangue e permanecerá sempre comigo. Por conta dessa visão social e engajada que tenho da vida, acredito que nunca deixarei de ser jornalista, apesar de hoje ter planos de me tornar escritora e cursar pós-graduação em jornalismo literário. Hoje faço freelances de jornalismo, trabalho como consultora na área da inclusão; e ministro palestras motivacionais em di­versas instituições e empresas para as quais sou convidada.


Algo importante que preciso salientar também é que, infelizmente, a maioria das 45 milhões de pessoas com deficiência no Brasil ainda vivem em situação de pobreza, sem nenhum recurso garantido por parte do Estado. Muitas ainda estão trancadas dentro de suas casas, presas em uma cama, sem possibilidade de conquistar seu direito ao trabalho, totalmente marginalizadas. E isso está acontecendo agora. Graças à minha família, tive condições de dispor de um bom tratamento, de fazer faculdade, conquistar autonomia. A maior parte dos jornalistas com deficiência também compartilha desta condição financeira mais estável do que a maioria. Por esse motivo é tão difícil encontramos jornalistas com deficiência que são de origem pobre, simplesmente porque as pessoas de classe social mais baixa ainda não tiveram condição de cursar faculdade. Ou quando tem a oportunidade ainda são barrados nas redações de emissoras de TV, revistas, jornais e rádios, por puro preconceito e discriminação.


*Leandra Migotto Certeza é jornalista por formação, consultora por profissão, e escritora por paixão. Recebeu o Prêmio de Classificação de Excelência no Concurso de "Periodismo y Comunicación Sociedad para Todos" na Colômbia em 2003, pelo artigo sobre educação: "Ser e Estar" (publicado em diversos portais); e o prêmio na categoria pôster sobre o projeto: “Fantasias Caleidoscópicas” (relativo à sexualidade da pessoa com deficiência) durante o "Sexto Congresso Internacional - Prazeres Dês-Organizados Corpos, Direitos e Culturas em Transformação", realizado pela Universidad Cayetano Heredia, em Lima em 2007. Seus blogs são: http://leandramigottocerteza.blogspot.com/ e http://fantasiascaleidoscopicas.blogspot.com/.