terça-feira, 29 de novembro de 2011

Fiscalizar a acessibilidade já!

Fonte: http://gpecchio.blogspot.com/2011/11/assessibilidade.html


28/11/2011


ACESSIBILIDADE


Imagem: mãos das alunas Laura e Mariana lendo o livro "Um par de asas para Toby", em braile e tinta ampliada, na biblioteca do colégio Ofélia Fonseca, Higienópolis, capital, SP

Mundo acessível é onde cabem, em primeiro lugar, diferentes pensares sobre os mesmos assuntos. É onde há igualdade de oportunidade para todos, sabendo que muitos precisam mas poucos fazem por merecer. 


Mundo acessível é pensar em protocolos universais para todos os assuntos que garantam a vida e a qualidade dessa vida. 


Desde 5 de janeiro estou em casa, numa difícil readaptação à vida e às coisas simples do cotidiano. Uma das poucas coisas acessíveis na minha casa, a tábua de passar roupas, quebrou e não acho outro modelo onde caibam as pernas da cadeira de rodas. 

Sem falar da pia e do fogão da cozinha. Adoro cozinhar e lavar louça e simplesmente não sei como resolver isso.


Já no tanque de lavar posso dar banho no cãozinho aqui de casa. Mesmo sem controle de tronco vou balançando mas não caio e ele me ajuda muito, melhor do que qualquer ser humano. Cachorros e cavalos são animais sensitivos e muito inteligentes. Conhecem a nossa alma.


Como seria bom se nossos legisladores e gestores públicos pensassem como é inviável para pessoas com necessidades especiais morar em cidades sem desenho universal na sua arquitetura. Nem nos modernos prédios, em construção, são respeitadas as normas técnicas ABNT de acessibilidade. Onde está a legislação e a fiscalização? 


Todos nós envelheceremos, adoeceremos e somos passíveis de nos acidentar e ficarmos privados, temporária ou definitivamente, do andar com o uso das pernas ou sem o uso de uma bengala ou cão-guia. 


E o que dizer às crianças e adultos cegos sem livros em braile para se alfabetizar e ter acesso aos saberes? 


Vamos refletir sobre isso hoje, amanhã, dia 3 de dezembro e sempre.

A pequena-grande Lívia


Fonte: http://www.rac.com.br/blog/31255/32/katia-fonseca/o-bebe-de-fabiola-e-fernando

02/08/2011 20:44:18
O bebê de Fabíola e Fernando  Compartilhar

Descrição da imagem: em primeiro plano está Fabíola, uma jovem loira, de cabelos compridos, grávida - final da gravidez; ao fundo está Fernando, marido de Fabíola; ambos estão sorrindo e ambos são pessoas com nanismo (pequenos)


A ciência garante que é possível, mas a maioria duvida: pessoas pequenas podem gerar filhos que terão estatura padrão. Fabíola Dreher Guimarães e Fernando Vieira Guimarães são a prova viva disso. O casal, que mora em Campinas, deu à luz, no dia 25/08, Lívia, uma bebê com saúde e que não terá problema de crescimento. Qual a expectativa da mamãe novata? “Se Deus me deu uma filha e ela terá uma estatura padrão, é porque eu terei capacidade de criá-la!”

O parto aconteceu na Maternidade de Campinas e Lívia veio ao mundo pelas mãos dos médicos Francisco Carmona e Márcia Teresinha Stefano Carmona. A bebê nasceu às 19h, pesando 2,865kg e com 48,5cm de comprimento. A doutora Márcia acompanhou toda a gestação.

Fabíola tem 21 anos e mede 1,20m. Fernando tem 28 anos e mede 1,35m. Eles se conheceram há cerca de três anos, pela internet. “O Orkut tem uma comunidade só de gente pequena”, explica Fabíola, contando que foi pela web que travou os primeiros contatos com Fernando. Em maio de 2009, eles se viram pela primeira vez, “numa balada de pequenos” - diz a jovem – em São Paulo. Começaram a namorar e, em um ano, estavam casados.

Nenhum dois dois nasceu em Campinas. Ela é da cidade de Cianorte, no Paraná. Ele nasceu na Capital paulistana. “Vim para Campinas em busca de melhores oportunidades, tanto de estudo quanto de trabalho”, conta Fabíola que escolheu a cidade porque sua irmã já morava por aqui. Fernando veio atrás de Fabíola. “Me apaixonei por ela”, confessa.


Histórico 


A história de vida de Fabíola e de Fernando são bem diferentes, assim como a origem de seus respectivos nanismos acondroplásico. Este é o nome científico da patologia que acomete a maioria das pessoas que não desenvolvem um tamanho de estatura padrão. Vulgarmente chamados de anões, as pessoas com nanismo, em geral, não ultrapassam 1,40m de altura. O problema de crescimento pode ter origem glandular ou óssea. No caso da acondroplasia, é óssea. Por causa de uma mutação no momento da gestação, acontece uma má formação óssea que vai comprometer o desenvolvimento do esqueleto do feto.

Fabíola é a única “pequena” de sua família – é assim que ela prefere ser denominada. A caçula de três irmãs surpreendeu os pais ao nascer. Ela conta que sua mãe nunca teve uma posição médica oficial explicando o motivo de ter sido afetada com a acondroplasia. “Baladeira” - como ela própria se define – Fabíola diz nunca ter se sentido rejeitada. “Minha mãe nunca me tirou do público. Ela tinha lanchonete e eu ficava o tempo todo com ela. Todo mundo me conhecia. Eu ia pra balada desde criança, com as amigas da minha irmã.”

Já Fernando é filho de uma mulher que também tinha esta má formação óssea. Mas a mãe dele, por sua vez, também era a única com essa característica. “Minha mãe era a 18ª de uma prole de 20 filhos e foi a única que nasceu com nanismo”, relata Fernando, cujos pais eram da Bahia.
Mas ter nascido com acondroplasia foi o que menos pesou na infância de Fernando: ele não conheceu o pai; perdeu a mãe aos 4 anos, passando ser criado pela avó; perdeu também a avó aos 11 anos; e foi criado pelos tios. “Meus tios não tinham filhos e me criaram com muito amor. Sou superfeliz, eles me ensinaram a ter dignidade”, afirma Fernando.


Gravidez 


Fabíola ficou grávida sem planejar. Ela e o marido dizem que ainda era muito cedo, queriam esperar mais um pouco. No entanto, filhos sempre estiveram nos planos de ambos. “Sempre quis ser mãe”, conta ela, seguida de perto por ele: “Eu sempre quis ser pai. Acompanhar a gravidez da Fabíola me ajudou a crescer como pessoa. Casamento já era bom e, agora, está melhor ainda”.

Nos três primeiros meses, Fabíola passou muito mal por causa dos enjoos. Mas nada que não seja esperado da maioria das gestações. Depois, teve uma gravidez tranquila. Nem mesmo a barriga avantajada a impediu de ter uma vida normal, com agilidade e disposição.

Ela foi acompanhada durante toda a gestação pela médica Márcia Teresinha Stefano Carmona e fez ultrassonografia periodicamente – numa frequência maior do que a maioria das grávidas, para um completo monitoramento do crescimento do feto. “No começo, eu fiquei apreensiva, não sabia os riscos para a saúde da Fabíola e do feto. Poderia haver problema de toximia, a diabetes poderia aparecer precocemente e eu tinha, ainda, a preocupação com a formação do bebê”, conta a médica. “Mas tudo transcorreu normalmente.”

Fabíola e Fernando preferiam ter gerado um bebê como eles – que se tornasse também um “pequeno”. “Os médicos torciam para que nossa filha tivesse estatura padrão e achavam que a gente torcia pra isso também”, conta o pai. Ambos estão ainda em suspenso a respeito de como será criar uma criança “grande”.


“No começo, eu estava pirando com o fato do bebê não ser um 'pequeno'”, confessa Fernando. “Mas, agora, penso que tudo será uma questão de como vamos educá-lo.” A mamãe ainda não sabe como vai agir e se sentir frente à doce Lívia que acaba de nascer. Mas sabe o que quer para o futuro de sua bebê: “Quero que ela estude e aprenda várias línguas”.


(Reportagem minha publicada na mídia de Campinas - jornais Correio Popular, Diário do Povo e Notícias Já, além do Portal RAC, NO DIA 26/08/2011)

A presença da diversidade dentro do tecido social


Fonte: http://www.rac.com.br/blog/31789/32/katia-fonseca/a-diversidade-sinalizando-o-desconhecido

22/08/2011 16:25:54
A diversidade sinalizando o desconhecido  Compartilhar3
foto:

Por Lilia Pinto Martins

Li recentemente, no Portal RAC, do maior grupo de mídia impressa do Interior de São Paulo, reportagem de nossa amiga Katia Fonseca, jornalista e Presidente do CVI-Campinas. A matéria, do dia 25 de julho, trazia como título “Casal com Nanismo Gera Criança Sem Problema Físico”. (A reportagem está postada aqui neste blog, no dia 02/08/;2011 - veja http://www.rac.com.br/blog/31255/32/katia-fonseca/o-bebe-de-fabiola-e-fernando)

Recolho da reportagem aqueles trechos que considero mais significativos para conhecer a história do casal e, neste contexto, lançar algumas questões que me parecem instigantes.

A começar, pela introdução da própria reportagem: “A ciência garante que é possível, mas a maioria duvida: pessoas pequenas (1) podem gerar filhos que terão estatura padrão”.

E continua: “Fabíola Dreher Guimarães e Fernando Vieira Guimarães são a prova viva disso. O casal, que mora em Campinas, deu à luz, nesta segunda-feira (25), Lívia, uma bebê com saúde e que não terá problema de crescimento”.... “Fabíola tem 21 anos e mede 1,20m. Fernando tem 28 anos e mede 1,35m. Eles se conheceram há cerca de três anos, pela internet ..... Em maio de 2009, eles se viram pela primeira vez, ´numa balada de pequenos`, em São Paulo. Começaram a namorar e, em um ano, estavam casados”....

“Nenhum dos dois nasceu em Campinas. Ela é.... do Paraná, e ele nasceu na capital paulistana ... e vieram para Campinas por diferentes razões: Fabíola em busca de melhores oportunidades de estudo e trabalho .... e Fernando atrás de Fabíola. ´Me apaixonei por ela`, confessa”. “Fabíola ficou grávida sem planejar .... No entanto, filhos sempre estiveram nos planos de ambos”..... “Nos três primeiros meses, Fabíola passou muito mal por causa dos enjoos. Mas nada que não seja esperado da maioria das gestações ... Depois, teve uma gravidez tranqüila”..... 

“Fabíola e Fernando preferiam ter gerado um bebê como eles – que se tornasse também um pequeno. ´Os médicos torciam para que nossa filha tivesse estatura padrão e achavam que a gente torcia pra isso também`, conta o pai. Ambos estão ainda em suspenso a respeito de como será criar uma criança grande .... ´No começo, eu estava pirando com o fato do bebê não ser um pequeno, confessa Fernando... A mamãe ainda não sabe como vai agir e se sentir frente à doce Lívia que acaba de nascer. Mas sabe o que quer para o futuro de sua bebê....”.
Uma reportagem sensível, apresentando a narrativa de simples fatos que cercam nosso cotidiano, estimula-nos a ir além dos fatos, procurando ângulos não antevistos. Desse modo, fui instigada a examinar dois aspectos da reportagem que me chamaram a atenção de imediato.

Em primeiro lugar, fica patente o afeto e o cuidado que ambos inspiram um para com o outro, cercando a relação de uma “liga” muito peculiar chamada enamoramento. Nada de muito particular, já que esta “liga”, ou melhor “vínculo afetivo”, é parte intrínseca das relações humanas. 

Mas o que dizer, vindo de pessoas tradicionalmente tratadas como “bobos da corte”, e vivendo apenas em função do divertimento e do prazer que despertam nos outros? Como imaginar, pensariam alguns, que neste “mundo dos pequenos” (2) existiria algo além daquilo para o que estes “pequenos” estão destinados, ou seja, ser pretexto de piada para espetáculos circenses ou programas humorísticos? Nada mais reducionista que um pensamento desta natureza, revelando o quanto dentro de nossa “humanidade” podemos ser perversos, estigmatizando pessoas e confinando-as em padrões de existência muito aquém de sua condição humana.
Felizmente, a realidade, sinalizando fatos como o da reportagem, confirma uma convicção que sempre tivemos, e que mostra como a diferença que cerca os humanos entre si, não lhes retira a humanidade, conferindo-lhes os mesmos anseios e desejos que acompanham os seres humanos em geral, desde que o mundo é mundo. E por uma razão muito simples: somos pessoas, acima de qualquer diferença.

Um segundo ponto a focalizar: tanto Fabíola, quanto Fernando mantinham a expectativa de ter um filho também “pequeno”, mostrando-se surpresos ao tomar conhecimento do contrário, por não saberem como seria lidar com uma criança “grande”, ou seja, com uma filha que terá padrões de estatura diferenciados dos padrões de ambos. E mal leio este trecho da reportagem me vem a pergunta: curioso, a expectativa do casal não deveria ser o inverso da que experimentaram, ou seja, ter um filho com uma estatura padrão, que o identificaria dentro dos padrões sociais da normalidade? Não é sempre a expectativa pela “normalidade” que se coloca frente a situações novas, profundamente investidas de emoções e sentimentos, como é o nascimento de um filho? E não é exatamente o contrário que se verifica, isto é, a “normalidade” da filha causando dúvidas e estranheza ao jovem casal? Como é desejar que se repita no filho uma condição de “diferença”, que em lugar de trazer seu significado intrínseco de individuação, é normalmente tratada e representada como minusvalia? Que força misteriosa é esta, atraindo para o que é “igual”, mesmo quando o igual significa a diferença? Sim, porque o caso em questão é exemplar para apontar este paradoxo, quando a condição de diferença dos pais é vivenciada como “normalidade”, a ponto de suscitar neles a expectativa por um filho igual dentro da diferença que os identifica. E para surpresa geral, a condição de “normalidade” da filha causa estranheza exatamente pela diferença que apresenta em relação aos pais. 

Este questionamento leva a supor que, em princípio, somos guiados pelo desejo por um mundo que não tenhamos que ser defrontados com a diversidade, condição que não deixa de ser aprisionante, mas que sem dúvida fala de sentimentos e desejos bem primitivos. Tenho a impressão que, de fato, estar frente à diversidade, com tudo o que isto representa, é dar-se conta de um outro, que sendo diferente de nós, suscita dúvidas, angustias e conflitos, por fugir a nosso desejo de ter este outro como espelho de nós mesmos, continuando a ilusão de que somos o centro do mundo. Nada nos assusta mais do que o desconhecido e o inesperado, que rompe com esta ilusão, retirando-nos do “paraíso” e reavivando ameaças muito primitivas, tanto de nosso passado pré-histórico, quanto de nosso psiquismo primário, formado por fantasias insconscientes que nos acompanham em nosso desenvolvimento humano. 

Lidar com a diferença, trazendo o desconhecido e o inesperado, será sempre uma situação desafiante, frente, talvez, a uma escolha alternativa e preferencial que não apresente conflitos a primeira vista. Esta pode ser uma das razões porque é tão usual colocar alguns segmentos que representam a diversidade, fora dos padrões humanos e sociais. Mas nada tão ilusório quanto negar o conflito em quaisquer perspectivas das relações humanas, conflito, a meu ver, origem, não só de litígios intransponíveis, como também de processos estruturantes para relações mais humanizadas e oxigenadas, exatamente, pela presença da diversidade dentro do tecido social. 

(1) Denominação adotada pelo casal entrevistado
(2) Adoto a denominação utilizada na reportagem, seguindo a opção do casal entrevistado.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Mais mitos e preconceitos na educação inclusiva

Mitos e preconceitos em torno do aluno com deficiência na escola regular e na escola especial - Parte final


Por Dr. Francisco J. Lima da  Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Centro de Estudos Inclusivos (CEI/UFPE).




“Os mitos e preconceitos, que historicamente batem à nossa porta, encontram guarida nas casas dos que não têm bem fundados os pilares anteriormente mencionados; e como somos todos frutos dessa história, cabe a cada um de nós detectar onde estamos sendo promotores dessa sociedade segregacionista e excludente, para que possamos ser agentes operadores da transformação social, mesmo que para isso precisemos lutar contra nossos próprios “princípios” como lutaram aqueles que perceberam que era errado escravizar pessoas humanas, por conta de sua cor de pele”.
Na escola, esses preconceitos aparecem na fala de professores que alegam não poder ensinar alunos cegos porque não sabem o Braille, código de escrita em relevo que muitas pessoas cegas ou com muito baixa visão fazem uso. Sob o manto da dificuldade de saber um código, de um despreparo para a escrita e leitura nesse sistema de escrita, o professor desvela sua descrença de que um aluno cego possa aprender, tal como ele, professor que enxerga, que é “perfeito” etc. foi capaz de aprender. Revela, ainda, que teme o contato com esse aluno, talvez por um medo oculto de que venha “pegar” a deficiência ou de que os demais alunos seus precisarão “diminuir” o ritmo de aprendizagem para que o aluno com deficiência visual os acompanhe, sendo portanto, aqueles, prejudicados.
Outros professores, coordenadores de cursos etc., alegam não poderem ensinar um aluno surdo, pois não foram preparados para comunicar-se com esse aluno que, talvez, fale Libras e não português.
Mitos e preconceitos em torno do aluno com deficiência na escola regular e na escola especial - Parte 1A desculpa da comunicação tem levado muita gente ao radicalismo de querer que filhos de pessoas surdas recebam tratamento genético para que nasçam igualmente surdos; que se construa cidades para surdos; que se construa universidades para surdos e, aqui, em nosso Brasil, carente que somos economicamente, se tem defendido a proliferação de escolas exclusivas para surdos.
Nunca, em parte alguma, se constituiu problema a coexistência do multilingüismo, a união de pessoas de origem lingüísticas diferentes, o ensino de estrangeiros de línguas diversas em uma só escola (como se vê com freqüência nas grandes universidades); entre outras manifestações sociais onde pessoas de origem lingüística diversas se unem e aprendem, em conjunto, objetos comuns do conhecimento.
No entanto, os apologistas do segregacionismo têm levado muitas pessoas com deficiência auditiva a pensarem que o respeito e a divulgação de sua língua deve caminhar pelo segregacionismo.
O equívoco, aí, resiste na promoção de um preconceito histórico em relação à pessoa surda, mormente relacionado a se pensar que a pessoa surda tem deficiências cognitivas; que não aprendem; que não são capazes de se desenvolver dentro da sociedade etc.
Por conta disso, ainda, crianças surdas são acusadas de agressivas e de que “são mesmo diferentes”, numa clara alusão aos indicativos de que as pessoas surdas teriam “desígnios” outros que o da pessoa “normal”.
Mas, se há resistência em ensinar os alunos deficientes auditivos sob a argumentação da dificuldade de comunicação oral; se há resistência em ensinar alunos com deficiência visual por conta de uma pseudo dificuldade de comunicação escrita, os alunos com deficiência intelectual ou síndromes sofrem ainda mais o preconceito e a resistência de professores que alegam temer pela integridade de seus alunos, e de sua própria, porque esses alunos seriam agressivos.
Fato que não tem base de comprovação, não mais que a possibilidade de que qualquer outro aluno agrida um seu colega, ou seu professor, como se vê com freqüência nos noticiários.
Ocorre que sob o manto da proteção do outro, esse professor desnuda toda sua capacidade de ser desumano, de jogar fora sua ética profissional, a qual deveria estar esteada no ensino e não na discriminação, enfim, revela a crueldade de tomar para si, o direito de decretar aos outros, em geral crianças indefesas, a morte social, o limbo cultural e mesmo, a própria morte física.
Obram aqueles professores, coordenadores, donos de escola etc. (que tiranicamente determinam ou tentam determinar quem vai aprender ou quem não vai) como déspotas, como carrascos de inocentes, quando deveriam ser os defensores de uma sociedade do conhecimento, onde o maior deles começasse pelo conhecimento do próprio homem quanto ser transformador do mundo para o bem da humanidade.
É essa transformação consciente que deve, portanto, pautar os educadores para que uma consciência inclusiva seja construída e a sociedade, hora excludente, passe a ser uma sociedade de cooperação, de respeito, de sabedoria.
Os mitos e preconceitos, que historicamente batem à nossa porta, encontram guarida nas casas dos que não têm bem fundados os pilares anteriormente mencionados; e como somos todos frutos dessa história, cabe a cada um de nós detectar onde estamos sendo promotores dessa sociedade segregacionista e excludente, para que possamos ser agentes operadores da transformação social, mesmo que para isso precisemos lutar contra nossos próprios “princípios” como lutaram aqueles que perceberam que era errado escravizar pessoas humanas, por conta de sua cor de pele.
Não há inclusão se não houver transformação e não há inclusão plena se a transformação não for contínua, consciente e concreta.
Agora, detenhamos-nos a examinar os 3 Cs da inclusão.
Tenho enfatizado aqui a idéia de que a sociedade como está, expulsa de seu meio muitos de seus membros, e a muitos mais nega a entrada. Tenho chamado sua atenção para a necessidade de transformação da sociedade atual, para uma sociedade de pessoas humanas e não de algumas pessoas tão somente.
Mudar, pois, é preciso e essa mudança tem de começar já. A hora é agora, o lugar é este e os agentes da mudança é cada um de vocês. Somos todos nós! Basta que sejamos corajosos para dizer em voz alta que esta sociedade, da qual fazemos parte, não nos serve mais; não responde à nossa compreensão de mundo, não contempla nosso entendimento de quem é pessoa humana entre nós, enfim, que esta sociedade está bichada e precisamos dedetizá-la.
Isso significa, portanto, que devamos aproveitar o que dela está bom e há muito de bom nela, mas que devemos igualmente reparar o que não presta e há muito que não presta nesta sociedade.
A transformação de que falo aqui é a própria transformação de nossos sentimentos, crenças e atitudes perante nossos pares, perante nós próprios, descobrindo, a cada momento, que somos capazes, pela descoberta de que o outro é capaz e descobrindo que temos um grande potencial, pela descoberta e reconhecimento do potencial do outro.
Trata-se, pois, de uma transformação contínua e consciente, e se trata também de uma transformação concreta, já que ela tem de refletir em nossas atitudes, em nossas ações, em nossas falas, e, acima de tudo, em nós mesmos.
A inclusão, portanto, não é algo de que se fala, mas algo que se vive, intensa e conscientemente, contínua e tenazmente, concreta e francamente. A Inclusão é a participação de todos pelo todo, com todos.
A inclusão não é uma mera teoria da moda, mas uma atitude de vida; uma expressão de sociedade e cidadania; uma compreensão de que todos os seres humanos são humanos sem distinção.
Caminhando para o fim de nossa fala, aprofundemos um pouco no que é isso que se tem chamado de Inclusão.
Já vimos que é um processo de transformação, já vimos que esse processo é contínuo, que deve ser consciente e que deve começar pela transformação em nós, para emanarmos para os outros, através de nossas ações concretas. Também, estabelecemos que a Inclusão pressupõe, na prática, reconhecer no outro, aluno ou não, o potencial para aprender e a capacidade de ser. Isso tudo significa quebrar tabus em relação à pessoa com deficiência, implica em pôr por terra barreiras atitudinais; pressupõe um novo modo de ser e viver. Viver na cooperação, na parceria, no respeito e, porque não, no amor.
Nesse momento, os que conseguiram chegar até aqui, devem estar pensando que a Inclusão pode ser fácil na fala, na teoria, mas que na realidade, ali na sala de aula, com aluno de verdade, isso é impossível.
Eu digo que na fala, na teoria é mais difícil que parece, e na realidade, tenho notícias para vocês, é possível sim. Exemplo disso é estarmos tratando desse assunto aqui e agora; é temos pessoas neste exato momento lutando a batalha da acessibilidade, do desenho universal, do respeito aos idosos, do acesso à educação com qualidade para todos, enfim, a batalha da sociedade de pessoas humanas contra a sociedade de alguns humanos, fortes sim, mas não invencíveis.
Cabe a vocês decidirem em que lado lutar, pois em um deles estarão, já que nesse embate, os “neutros” tomam o lado da sociedade excludente e segregadora, por omissão, conivência e cumplicidade, como vimos.
Na revolução do “todos somos diferentes” e não do “todos são iguais”, não se mata o “oponente”, ganha-se-lhe para nosso lado; não se tem o outro como “adversário”, mas como parceiro na solidificação de nossos princípios e ações, enfim, na revolução pela inclusão de todos no todo social vive-se a totalidade, não o totalitarismo; vive-se a participação de todos e não a de uma parte; vive-se e não apenas se aceita a sobrevivência.
Assim, sendo uma revolução que começou há muito tempo, mas que nos dias de hoje ganha cada vez mais força; sendo uma revolução do contínuo transformar-se; e sendo a revolução das pessoas humanas, o que hoje se chama de Inclusão, e que no futuro se poderá chamar de outra forma, não é uma moda, ou modismo, não é uma mera teoria, é o caminhar para o sempre, é o caminhar para a busca da felicidade de todos com todos e entre todos.
Considerações Finais
Intitulamos a presente fala como “Mitos e Pré-conceitos em Torno do Aluno com Deficiência na Escola Regular e na Escola Especial”, e, por esse momento, muitos devem estar se indagando se estão na palestra certa.
Aparentemente, se fez uma digressão do tema, no entanto, quero concluir, mostrando que o que apresentamos anteriormente relaciona-se direta e sintomaticamente na escola.
Frequentemente, deparamo-nos com situações onde alunos com deficiência são rejeitados por suas escolas, ou a elas são negados entrar, ainda hoje, educadores “acusam” pais de crianças com deficiência de não terem aceitado seus filhos, justificando por essa rejeição comportamentos, estereotipias etc. de alunos com deficiência.
Crianças autistas são recusadas nas escolas, ou dentro delas execradas, porque os “especialistas” que a acompanham ainda as vêem como seres agressivos, incomunicáveis, sem potencial ou incapazes de aprender.
Ainda hoje, nossa experiência tem mostrado, educadores fazendo análises “psicológicas” de deficiências mentais, síndromes e deficiências sensoriais. Querem esses especialistas expurgar/exorcizar a deficiência; pretendem eles encontrar uma causa, um diagnóstico, algo que lhes permita subsidiar/justificar suas ações excludentes.
Assim é que em abril de 2005, podemos afirmar que o preconceito é atual, visto que está ocorrendo agora, e é internacional, posto que não é “privilégio” do Brasil, ocorre aqui, nos países de primeiro mundo e nos de terceiro também.
Ainda hoje, educadores tratam as crianças com síndrome de Down ou com outras deficiências mentais, não como alunos em suas escolas, mas como “crianças que precisam socializar-se”, e que estão nessas escolas. Ainda promovem um “ensino paralelo” dessas crianças, ao invés de educá-las com os demais alunos. Com benevolência, esses educadores “recebem” aquelas crianças na escola, mas não as aceitam como pessoas humanas.
Em abril de 2005, educadores resistem a ensinar alunos com deficiência sensorial (cegos e surdos). Alegam estarem despreparados, afirmam não terem conhecimentos especializados nessas pessoas. Revelam, enfim, sua total descrença de que pessoas humanas são diferentes e podem apresentar deficiências, confirmando os preconceitos históricos que têm levado à exclusão as pessoas com deficiência, por conta do grande mito que é a crença de que a uma pessoa que falte um sentido, uma parte de seu corpo etc., falta-lhe a condição de pessoa humana.
Meus caros, acreditar na existência de uma escola especial separada, preparada para educar exclusivamente pessoas com deficiência, é acreditar numa sociedade de alguns; é negar a capacidade do Professor Humano em educar, ensinar, transmitir conhecimento, facilitar/mediar conhecimento etc. a todos e é acreditar que os alunos com deficiência não têm potencial para aprender, não são capazes, e não são Humanos, como conceituado anteriormente. é a essa sociedade que repudiamos, e é a essa sociedade que queremos pôr fim. Sejamos “Um Todo”, e estejamos com Todos, na educação, no trabalho, na saúde, no lazer, enfim na sociedade de Todos, na sociedade de Pessoas Humanas.

Fonte: http://www.mp.pe.gov.br/

Educação inclusiva - Mitos e preconceitos


Mitos e preconceitos em torno do aluno com deficiência na escola regular e na escola especial - parte 1
Caro leitor, o artigo abaixo, foi escrito pelo Dr. Francisco J. Lima da  Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Centro de Estudos Inclusivos (CEI/UFPE). Como o texto é longo ele foi dividido em duas partes. Acompanhe hoje a primeira parte desse reflexivo texto.
“… Continuar com a passividade perante os que alegam, com seus discursos distorcidos, que “a inclusão tem de ser feita com vagar; com prudência; sem leviandade…” é sermos cúmplices da exclusão de centenas de milhares de pessoas, por conta de sua deficiência e coniventes com a exclusão de um sem número de outras pessoas, crianças, jovens e adultos que sequer aparecem nesta sociedade, defendida pelos que dessa forma discursam.”
1- O preconceito para com os alunos com deficiência e a resistência em educá-los é atual e internacional.
2- Não há inclusão se não houver transformação e não há inclusão plena se a transformação não for contínua, consciente e concreta.
3- A inclusão não é uma mera teoria da moda, mas uma atitude de vida; uma expressão de sociedade e cidadania; uma compreensão de que todos os seres humanos são humanos e como tais devem ser tratados e respeitados; enfim, é um caminho para o sempre, para o infinito, para o eterno transformar do aqui e agora.
 Introdução
Ao iniciarmos nossa apresentação, gostaríamos de oferecer algumas das fundações sobre as quais estaremos construindo nossas reflexões.
Assim, tomemos como primeira fonte de sustentação para nossa fala o significado de direitos humanos e pessoas humanas.
Aqui entenderemos direitos humanos, no seu sentido mais amplo, no sentido daquilo que cada um, ao olhar para dentro de si, sente como sendo o direito do conjunto de todas as pessoas, isto é, da humanidade: o direito à vida (o direito de ter e manter a vida); o direito à saúde (alcançar, ter e manter a saúde mental, física e psicológica); o direito ao trabalho (ter um emprego, preservar as condições de o manter, ser pago dignamente pelo trabalho feito); o direito à educação (ter acesso à escola e à educação com qualidade, ter condições de igualdade na aprendizagem, ter respeitado seu tempo e modo de adquirir e manifestar conhecimento e ser reconhecido no seu conhecimento manifesto ou adquirido); o direito ao lazer (ter acesso digno, respeitoso e com freqüência ao lazer e aos locais de lazer, sem restrições ou tutelas de outrem).
A pseudo-redundância da expressão “pessoa humana” se faz necessária, visto que nem todas as pessoas, no modelo social em que vivemos, são tratadas como humanos. Pelo contrário, há bem mais pessoas sendo tratadas como algo menos que animal que como humanos dotados dos direitos anteriormente mencionados.
Referimo-nos aos muitos alunos com deficiência, a quem é negado o direito à educação por diretores, coordenadores de curso, donos de escolas, professores, tutores legais, pais etc., por acharem que são eles que devem decidir a respeito da vida das pessoas com deficiência. E fazem isso, sob o argumento pueril de que “será melhor para o aluno com deficiência.”!
Referimo-nos como “pessoas humanas” àquelas muitas pessoas com deficiência a quem é negado o direito à saúde porque orientações religiosas, arcaicas e torpes, (fora do e infiltradas no meio científico) coíbem, dificultam impedem avanços científicos capazes de evitar, curar e impedir o agravamento de doenças e de outros quadros graves à saúde humana.
Referimo-nos como “pessoas humanas” àqueles muitos trabalhadores que, por conta de uma deficiência são “retirados” de seus empregos porque donos de empresas, médicos do trabalho e outros personagens de RH pensam que uma pessoa com deficiência perde sua eficiência quando perde um de seus sentidos ou uma parte de seu corpo, ou porque teve ou tem uma doença mental, ou ainda, porque tem uma deficiência mental.
Referimo-nos como “pessoas humanas” àquelas muitas pessoas a quem o direito ao lazer é denegado por donos de área de lazer, para quem seus parques aquáticos, seus “playcenters” etc. não estão preparados para “receber” pessoas com deficiência; referimo-nos como “pessoas humanas”, àquelas muitas pessoas com deficiência a quem os hotéis, centro de convenções, restaurantes, teatros, cinemas, órgãos de gerência municipal, estadual ou federal desrespeitam, negam, passam por cima do direito dessas pessoas de ir e vir para o trabalho, para escola para os estabelecimentos de saúde e de lazer, porque não tornam seus espaços físicos, acessíveis.
Referimo-nos como “pessoas humanas” aquelas muitas pessoas com deficiência a quem médicos e demais profissionais da saúde, da educação, da justiça, dos poderes legislativos e executivos maltratam, destratam, ou tratam mal, porque simplesmente desconsideram essas pessoas como sendo dignas de respeito, visto que, para eles, essas pessoas são “deficientes”, “menos válidos”, “menos gente”, portanto não merecendo que lhes sejam prestados cuidados em sua língua de comunicação social (Libras, por exemplo); em seu código de escrita acessível (em Braille, por exemplo) ou numa comunicação em linguagem acessível, como se deve usar em situações de atendimento médico, jurídico, educacional e outros (com pessoas com deficiência mental, com síndromes e com dificuldade de comunicação ou cognição).
Enfim, pessoas humanas são todas as pessoas, inclusive aquelas que no modelo social atual, estão fora.
Outro ponto de sustentação de nossa fala é o conceito de inclusão, o qual exige que a sociedade se transforme para respeitar, acolher e atender às necessidades de todos os seus membros, num contínuo fazendo. Sob a égide da inclusão, os limites de uma pessoa com deficiência estão na sociedade e não na deficiência do indivíduo.
Ao se entender isso, verifica-se que um aluno com deficiência pode não aprender, não por sua incapacidade de aprender, mas pela incapacidade de a escola o ensinar, respeitando o direito ao modo e tempo de aprendizagem individual do aluno.
Ao se reconhecer que está na sociedade o limite de uma pessoa com deficiência e não na sua própria deficiência, constata-se que um aluno “cadeirante”, por exemplo, só estará “incapacitado” de estudar comunicação se não houver acesso físico à sua sala de aula, ou aos locais de que necessite complementar seus estudos, como nas próprias salas de cinema.
Semelhantemente, no trabalho, uma pessoa surda só será “incapacitada” para trabalhar como locutora de rádio, se a ela não for dada a oportunidade de aprender a língua oral do grupo social em que está inserida e do qual faz parte. Se, pelo contrário, a ela for dada a oportunidade de ser falante da língua oral de comunicação de sua sociedade, então ela poderá ser locutora de rádio, como outro profissional qualquer.
Como se pode notar, a Inclusão é um transformar-se, e assim o sendo, significa pôr termo ao atual modelo social, o qual é excludente e que teve origem nos primórdios da raça humana, quando o homem pouco se diferenciava dos bichos.
Ocorre que os animais evoluíram, porém, muitas pessoas não acompanharam, sequer essa evolução, estando muito aquém dos animais, embora freqüentemente ofendam estes.
Sei que estas são palavras duras, porém, precisamos deixar de ser “diplomatas”, “políticos” ou “cautelosos” com o desrespeito aos direitos dos outros. Já é mais do que tarde para que deixemos de ser atores passivos dessa sociedade de exclusão que marginaliza pessoas que só querem (e devem) ter respeitado o seu direito de serem pessoas humanas.
Continuar com a passividade perante os que alegam, com seus discursos distorcidos, que “a inclusão tem de ser feita com vagar; com prudência; sem leviandade…” é sermos cúmplices da exclusão de centenas de milhares de pessoas, por conta de sua deficiência e coniventes com a exclusão de um sem número de outras pessoas, crianças, jovens e adultos que sequer aparecem nesta sociedade, defendida pelos que dessa forma discursam.
Faz parte, ainda, do discurso dos pretensos defensores da Inclusão, que eles chamam de “inclusão responsável”, dizer que “não basta jogar uma criança na escola e depois deixá-la lá”, ou ainda, “que se deve preparar a escola primeiro, porque se a escola já não atende os alunos normais, que dirá a essas pessoas!” Dizem isso sem terem coragem de nomear os alunos com deficiência: “quem dirá a essas pessoas…” alardeiam, enquanto negam-lhe o direito à educação.
Quando se promove a Inclusão, não se “joga” uma criança na sala de aula, nem a deixa sob a custódia de um estagiário ou babá. Quando se promove a Inclusão, ensina-se a todos os alunos sem distinção!
Como vimos anteriormente, portanto, a Inclusão pressupõe o respeito ao direito à educação com qualidade, pressupõe o respeito ao modo e tempo de aprendizagem do aluno, pressupõe dar condições de igualdade de acesso ao conhecimento etc., logo, qualquer dessas falas são despropositadas e nada têm que ver com Inclusão.
Também não cabe à Inclusão, a crítica que esta vem da imposição do governo; que vem de cima para baixo, à força, à goela abaixo etc.
Novamente, o discurso é destorcido, visto que é sabido que a inclusão é um movimento dos diversos grupos de pessoas em situação de vulnerabilidade, que, ao longo dos séculos sempre lutaram para ser reconhecidas como pessoas humanas e que, no presente, vêm logrando êxito.
Com efeito, o estudo das diversas declarações de direitos, bem como das cartas, nacionais e internacionais, sobre a pessoa com deficiência não deixam dúvidas que os governos respondem apenas minimamente aos anseios dos grupos vulneráveis, dentre os quais os das pessoas com deficiência.
Portanto, falar de Inclusão é oferecer educação de qualidade a todos os alunos, inclusive aos com deficiência; é responder às necessidades de todos os alunos, à medida que elas aparecem, juntamente com o aluno, sua família e os demais agentes do ato educativo. Isto é, com todos os personagens do entorno do aluno, incluindo demais alunos, pessoal de apoio das escolas, amiguinhos, namorada ou namorado. Todos!
Tomemos agora o terceiro pilar de sustentação de nossas reflexões. De fato, o mais importante deles, já que é no reconhecimento deste pilar que os demais se solidificarão.
Estamos falando da crença inconteste, incondicional, plena e irrestrita à condição de ser humano da pessoa com deficiência; estamos falando da crença inconteste, incondicional, plena e irrestrita no potencial da pessoa com deficiência e estamos falando da crença inconteste, incondicional plena e irrestrita à capacidade de a pessoa com deficiência aprender.
Será apenas quando assumirmos que crianças, jovens e adultos com deficiência têm tanto para nos ensinar, quanto temos para ensiná-los; só quando olharmos para nossos alunos com deficiência como potenciais “ajudantes” nossos no processo educativo de todos os alunos; só quando aceitarmos que as pessoas com deficiência não são deficientes e podem mesmo nos superar em várias habilidades; só quando ensinar for nosso objetivo último na educação; só quando o alcançar quantitativo de resultados deixar de ser nosso objetivo tácito e valorizado na educação; só quando entendermos que a educação se faz trabalhando com o outro e não para o outro, ou pelo outro; só quando cooperar for a palavra de ordem, em lugar do competir é que estaremos vivenciando, manifestando, praticando a crença inconteste, incondicional, plena e irrestrita no potencial, na capacidade, na inteligência, enfim, na totalidade indivisível da pessoa com deficiência. Só então, estaremos deixando de ver a deficiência da pessoa, para ver a pessoa com deficiência.
Até que estejamos firmes sobre esse pilar, de alguma forma os demais não estarão firmes. E, estar firmes no pilar da crença no potencial e na capacidade da pessoa humana é estar em constante transformação para reconhecermos no outro, aquilo que nem sempre está aparente, mas que está lá, pronto para se nos mostrar, se quisermos ver.
O preconceito para com os alunos com deficiência e a resistência em educá-los é atual e internacional.
Gostaria, agora, de levá-los a pensar quando e onde começou o preconceito para com a pessoa com deficiência. Também, gostaria que pensassem se, nos dias de hoje, abril de 2005, o preconceito em relação à pessoa com deficiência acabou, se ainda existe e se é igual ou diferente ao existente no passado.
É plausível que o preconceito em relação à pessoa com deficiência tenha começado há muitos milhares de anos. Talvez, com a própria humanidade.
Relatos históricos dão conta de que os espartanos jogavam os bebês com deficiência do alto da montanha, visto que não acreditavam que uma pessoa com deficiência poderia servir aos propósitos da sociedade de então.
Na Idade Média e até mais recentemente, os religiosos cristãos enclausuravam as pessoas com deficiência, sob o manto de os protegerem, mas tal fato servia também para retirarem da vista da sociedade, o que ela não queria ver à sua frente ou em seu meio. Isso sem contar aquelas que, tendo deficiência mental ou doença mental, eram sacrificadas, queimadas, sob a alegação de que eram possuídas pelo demônio.
Atualmente, verifica-se, mesmo em programas televisivos e outros, atuações de religiosos no exorcismo de demônios de pessoas supostamente possuídas, mas que pelos relatos dos que estão com elas, tais pessoas, ou apresentam doenças mentais, ou mesmo deficiências mentais.
Situações como essas fazem perdurar o preconceito para com as pessoas com deficiência, mormente as com deficiência mental ou síndromes.
Em muitos países da Europa e também nos Estados Unidos, ou aqui no Brasil, vê-se resquício do preconceito historicamente construído e propagandeado pela Bíblia e outros livros de grande penetração no imaginário social.
Exemplo disso é a crença de que os cegos são seres puros, dignos de pena, possuidores de dons sobrenaturais etc; que os surdos são pecadores, que, por não comunicarem pela língua oral, são uma “estirpe” de humanos diferentes etc.; que os deficientes mentais são possuídos pelo demônio; não são capazes de manifestar seus sentimentos, que são agressivos, que não “fazem parte deste mundo”, embora estejam fisicamente aqui, entre outros absurdos do senso comum, por vezes corroborados por chamados “especialistas”, como veremos mais à frente.
É fato, pois, que se analisarmos nossa literatura, nossas expressões idiomáticas, nossas manifestações culturais, religiosas etc., constataremos o tanto de idéias preconceituosas que aprendemos como sendo verdade a respeito das pessoas com deficiência. E isso não só é atual, como também é internacional. Ocorre agora, aqui, bem como em toda parte, em todos os lugares.
No entanto, em muitos países, se têm trabalhado para, cada vez mais, transformar essa situação de preconceito, tornando a sociedade mais baseada no reconhecimento de que todos somos diferentes e não de que todos somos iguais.
Com efeito, a única igualdade entre nós, ou o que nos torna a todos iguais, é o próprio fato de sermos diferentes. E esse é um dos pressupostos da Inclusão.

Fonte: http://www.mp.pe.gov.br/
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