domingo, 27 de dezembro de 2015

Feliz Ano Novo Inclusivo!


Minha mensagem de Ano Novo é que em breve não seja mais necessário falar de inclusão, pois ninguém será mais discriminado e colocado fora da sociedade pela sua condição HUMANA DIVERSA E IMPERFEITA DE SER!!!!






quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Leandra escreve para a Agenda Portadora de Eficiência 2016



Sexualidade e deficiência 
Um tabu a ser quebrado!

Eu não posso engravidar, mas tenho o direito de ser mãe tendo uma deficiência física! Eu não posso fazer amor com tanta volúpia, e em posições que sempre sonhei; mas posso ter orgasmos estupendos! Eu não posso sentir meu corpo mudar, ao abrigar um novo ser em meu ventre, mas posso amar – incondicionalmente – as crianças que habitam e habitarão o meu coração. Eu não posso amamentar um bebê quentinho em meus braços, mas tenho muita seiva escorrendo, pelos fios da minha alma, para alimentar espíritos sedentos.

Antes eu tinha vergonha de assumir que me gostava. Pensava: o que as pessoas vão dizer? Sabia que não sou mais criança (há muito tempo toquei meu corpo e senti vida pulsando!), mas ainda tenho tamanho de uma. E me tratam como se fosse. Sexo? Eu? Como? Não posso, mas quero. Quero tanto! Minha ‘mãe’ (interior?) dizia que eu ficava feia de saia. Meu ‘pai’ (interior?) não queria que eu usasse batom. Sempre fui olhada, observada, esquartejada, detalhada... Sempre fui comentada, falada, cochichada, fofocada, julgada... Poucos se aproximavam para me conhecer. Naquela época foi MUITO duro viver!

Afinal, nasci em uma sociedade que valoriza o equilíbrio, a beleza perfeita, o linear, a sincronia, a coerência, a igualdade das formas... Resumindo: o ideal da perfeição que não existe nesse Planeta. Todos os seres humanos são DIFERENTES. Todos sem exceção. Hoje assumo que sou diferente sim! Chamo a atenção. Mas quem não é? Quem não chama? Eu sou um pouquinho diferente do que as outras pessoas. Só isso. Já chamo a atenção por natureza. Não preciso fazer tatuagens, colocar piercing, pintar os cabelos de vermelho, usar uma melancia no pescoço...Para mim a beleza é a forma CALEIDOSCÓPICA que TODAS as pessoas têm. Beleza, sedução, sensualidade, sexualidade, amor, paixão, tesão e desejo são energias tão sutis e tão FORTES que estão em tudo que fazemos.

Porém, o senso comum ainda difunde e expressa um estigma sobre a sexualidade das pessoas com deficiência como assexuadas, visão esta, envolta por preconceitos e representações sociais. Ainda é um tema tabu, que pouco se discute e que vem sendo esclarecido apenas nos últimos anos. Nesse sentido, proporcionar o acesso à informação sobre o assunto busca contribuir para a construção das relações sociais.

É por isso, que as fotos e os depoimentos do projeto “Fantasias Caleidoscópicas”, que iniciei em parceria com a fotógrafa Vera Albuquerque, vão refletir as DELICIOSAS fantasias – ‘reais’ e imaginárias - que todos têm de si mesmo. Pessoas com várias deficiências (física, auditiva, visual, intelectual, múltipla, e surdocegueira), sejam elas: idosas, gestantes, obesas, casais homossexuais e/ou heterossexuais, de todas as etnias, e classes sociais, que em um estúdio fotográfico mostrarão sua sensualidade em poses sensuais.

O objetivo de Vera é questionar o padrão de beleza – instituído pelos meios de comunicação e pela moral dominante – ressaltando a possibilidade de uma democratização do prazer, uma igualdade de direitos sexuais, uma disposição das mentes (e dos corações) contra os juízos prévios e os preconceitos. E o meu, como jornalista, é dar voz às imagens é tão importante quanto o registro fotográfico, pois é interessante conhecer as histórias de vida dessas pessoas, que em sua maioria ainda são bem pouco ouvidas. O enfoque está na arte e na educação como agentes transformadores da realidade, aliados à palavra, como testemunha dos fastos e detentora de um poder de mudança na sociedade. Vale a pena conhecer o blog do projeto: http://fantasiascaleidoscopicas.blogspot.com/ .

Eu creio que mudar é o primeiro passo no sentido de favorecer a inclusão. A disposição de amar inclui a capacidade de acolher, trazer afetuosamente para perto de si o mundo e a vida em suas faces mais plurais. É enriquecedor receber o outro, no caso a pessoa com deficiência, disposto a compreendê-lo dentro de suas circunstâncias.


Leandra Migotto Certeza é Jornalista, Palestrante e Consultora em Inclusão há 15 anos. Trabalhou nas principais mídias sobre deficiência. Foi premiada em Lima e na Colômbia pelos seus textos. Hoje desenvolve o projeto Fantasias Caleidoscópicas, atua em universidades, empreas, órgãos públicos e ONGs, além de manter o blog: http://leandramigottocerteza.blogspot.com/ .





segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Clube da Escrita

A magia da cadeira imaginária

Por Leandra Migotto Certeza

Quando a semente foi fecundada e o embrião surgiu a magia começa. Com a forma de uma lua crescente em curva, surgimos sentados. E assim somos carregados dentro do ventre que habitamos, sentindo a vida mergulhados. Acreditam que ficamos a maior parte do tempo de frente, mas podemos virar de cabeça para baixo. Sempre formando uma letra L. Como uma cadeira. Mesmo que demore um pouco para conseguimos sustentar nossas cabeças, ficamos sentados. Acredito que seja para conseguirmos ver o mundo por um ângulo melhor. Passear no carinho é bem mais interessante do que ficarmos deitados no berço. O mundo pode ser explorado e está ao alcance dos nossos olhos e mãos, sem o esforço de nos sustentarmos em pé.

A minha cadeira foi apresentada aos 14 anos. Época em que uma menina, preferiria se aventurar no mundo com os próprios pés, correndo na beira da praia, sentindo o frescor da matas e o calor do asfalto, brincando de deixar de ser criança. Mas não tive escolha. Minhas pernas enfraqueceram, meu corpo ficou bem pesado, os colos não conseguiram me carregar mais por aí como cadeiras falantes. A única alternativa foi me sentar nela e sentir sua magia. Mesmo com muito receio, me adaptei as suas duas rodas grandes e duas menores, e aos olhares de todos que agora pareciam ser sempre maiores e mais altos do que eu. Só fui entender a liberdade que esta cadeira me proporcionou, depois que ela começou a fazer parte do meu corpo, e eu a confundir com minhas pernas e pés.

Hoje só não a levo comigo quando vou deitar na cama, cochilar no sofá ou me reconfortar em uma poltrona bem macia. Por que na maioria do tempo, sem ela, não sou ninguém! É com ela que assumo minha personalidade. Mesmo quando o taxista pergunta, se ela também vai comigo no carro, porque sem ela não consigo chegar ou sair dos lugares. É com ela que participo de cursos, escrevo, trabalho, vou até à natação, viajo, conheço novos lugares, converso com pessoas, faço palestras, danço, rodopio, carrego mochilas mais pesadas do que meu corpo, enfrento arreias macias e difíceis de passar até encontrar as ondas dos mares ou o frescor dos jardins e a beleza dos museus. Quando chego aos teatros ou salas de cinema, não preciso me preocupar em escolher a melhor cadeira, porque sempre estou com a minha. E mesmo desviando de buracos, subindo em guias íngremes, passando por poças de água, descendo rampas desniveladas, saltitando sobre os pedregulhos, nunca deixo de levar ela comigo porque sem ela não teria acesso ao desfrutar da vida.


Só espero que em breve, minha cadeira de rodas ganhe um motor bem forte que acelere sua capacidade de deslisar em lugares ainda inexplorados com muito mais conforto, segurança e bem menos esforço físico. Por que não temo mais a prisão que ela supostamente me colocaria quando a imaginava parada, sozinha em um cantinho da sala assistindo TV.    





Texto que será publicado no livro editado pelo SESC Pinheiros como fechamento da terceira temporada do Clube da Escrita.