quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Leandra escreve para a Agenda Portadora de Eficiência 2016



Sexualidade e deficiência 
Um tabu a ser quebrado!

Eu não posso engravidar, mas tenho o direito de ser mãe tendo uma deficiência física! Eu não posso fazer amor com tanta volúpia, e em posições que sempre sonhei; mas posso ter orgasmos estupendos! Eu não posso sentir meu corpo mudar, ao abrigar um novo ser em meu ventre, mas posso amar – incondicionalmente – as crianças que habitam e habitarão o meu coração. Eu não posso amamentar um bebê quentinho em meus braços, mas tenho muita seiva escorrendo, pelos fios da minha alma, para alimentar espíritos sedentos.

Antes eu tinha vergonha de assumir que me gostava. Pensava: o que as pessoas vão dizer? Sabia que não sou mais criança (há muito tempo toquei meu corpo e senti vida pulsando!), mas ainda tenho tamanho de uma. E me tratam como se fosse. Sexo? Eu? Como? Não posso, mas quero. Quero tanto! Minha ‘mãe’ (interior?) dizia que eu ficava feia de saia. Meu ‘pai’ (interior?) não queria que eu usasse batom. Sempre fui olhada, observada, esquartejada, detalhada... Sempre fui comentada, falada, cochichada, fofocada, julgada... Poucos se aproximavam para me conhecer. Naquela época foi MUITO duro viver!

Afinal, nasci em uma sociedade que valoriza o equilíbrio, a beleza perfeita, o linear, a sincronia, a coerência, a igualdade das formas... Resumindo: o ideal da perfeição que não existe nesse Planeta. Todos os seres humanos são DIFERENTES. Todos sem exceção. Hoje assumo que sou diferente sim! Chamo a atenção. Mas quem não é? Quem não chama? Eu sou um pouquinho diferente do que as outras pessoas. Só isso. Já chamo a atenção por natureza. Não preciso fazer tatuagens, colocar piercing, pintar os cabelos de vermelho, usar uma melancia no pescoço...Para mim a beleza é a forma CALEIDOSCÓPICA que TODAS as pessoas têm. Beleza, sedução, sensualidade, sexualidade, amor, paixão, tesão e desejo são energias tão sutis e tão FORTES que estão em tudo que fazemos.

Porém, o senso comum ainda difunde e expressa um estigma sobre a sexualidade das pessoas com deficiência como assexuadas, visão esta, envolta por preconceitos e representações sociais. Ainda é um tema tabu, que pouco se discute e que vem sendo esclarecido apenas nos últimos anos. Nesse sentido, proporcionar o acesso à informação sobre o assunto busca contribuir para a construção das relações sociais.

É por isso, que as fotos e os depoimentos do projeto “Fantasias Caleidoscópicas”, que iniciei em parceria com a fotógrafa Vera Albuquerque, vão refletir as DELICIOSAS fantasias – ‘reais’ e imaginárias - que todos têm de si mesmo. Pessoas com várias deficiências (física, auditiva, visual, intelectual, múltipla, e surdocegueira), sejam elas: idosas, gestantes, obesas, casais homossexuais e/ou heterossexuais, de todas as etnias, e classes sociais, que em um estúdio fotográfico mostrarão sua sensualidade em poses sensuais.

O objetivo de Vera é questionar o padrão de beleza – instituído pelos meios de comunicação e pela moral dominante – ressaltando a possibilidade de uma democratização do prazer, uma igualdade de direitos sexuais, uma disposição das mentes (e dos corações) contra os juízos prévios e os preconceitos. E o meu, como jornalista, é dar voz às imagens é tão importante quanto o registro fotográfico, pois é interessante conhecer as histórias de vida dessas pessoas, que em sua maioria ainda são bem pouco ouvidas. O enfoque está na arte e na educação como agentes transformadores da realidade, aliados à palavra, como testemunha dos fastos e detentora de um poder de mudança na sociedade. Vale a pena conhecer o blog do projeto: http://fantasiascaleidoscopicas.blogspot.com/ .

Eu creio que mudar é o primeiro passo no sentido de favorecer a inclusão. A disposição de amar inclui a capacidade de acolher, trazer afetuosamente para perto de si o mundo e a vida em suas faces mais plurais. É enriquecedor receber o outro, no caso a pessoa com deficiência, disposto a compreendê-lo dentro de suas circunstâncias.


Leandra Migotto Certeza é Jornalista, Palestrante e Consultora em Inclusão há 15 anos. Trabalhou nas principais mídias sobre deficiência. Foi premiada em Lima e na Colômbia pelos seus textos. Hoje desenvolve o projeto Fantasias Caleidoscópicas, atua em universidades, empreas, órgãos públicos e ONGs, além de manter o blog: http://leandramigottocerteza.blogspot.com/ .





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