“Eles ficam até morrer”
Uma vida de isolamento e negligência em instituições para pessoas com deficiência no Brasil
Leonardo, 25 anos, tem distrofia muscular – uma deficiência que causa fraqueza
progressiva e perda de massa muscular. Desde os 15 anos, ele morou em uma instituição
de acolhimento para pessoas com deficiência no Brasil. Sua mãe achava que não tinha
escolha a não ser colocá-lo lá.
“Sofri muito quando Leonardo precisou ser transferido para
a instituição…, mas não tive outra escolha. O Estado não me dá nenhum apoio para cuidar
dele em casa”, ela disse.
Sua esperança era que a instituição pudesse cuidar dele de uma
forma que ela não poderia.
Leonardo dividia um quarto com outros 24 homens e mulheres com deficiência. As camas
eram colocadas diretamente uma ao lado da outra, sem sequer uma cortina para dar
privacidade. Leonardo não tinha controle sobre sua vida; ele estava sujeito ao cronograma
e às decisões da instituição. Ele ficava na cama a maior parte do dia, mesmo para as
refeições, sem nada relevante para fazer:
"Eu sou colocado na cadeira de rodas de manhã, mas tenho que ser colocado de
volta na cama porque... não há ninguém para me colocar de volta à noite. Sinto
falta da minha casa e gostaria de morar com minha mãe, mas entendo que ela está
envelhecendo e que não poderia me aguentar fisicamente".
Em 2017, Leonardo voltou a morar com sua mãe por um curto período porque a instituição
onde morava não podia mais fornecer o apoio especializado que ele precisava. No final de
2018, ele se mudará para outra instituição que está em construção.
Carolina (nome fictício), uma mulher de 50 anos com deficiência física, descreve sua
experiência na instituição quando conversou com a Human Rights Watch:
"Este lugar é muito ruim, é como uma prisão. Eu não quero ficar aqui. Eu sou
obrigada a ficar aqui. Meus filhos não querem me ajudar em casa. Embora
dois dos meus filhos venham me visitar a cada duas semanas, eu nunca
saio. Eu gostaria de sair, ir embora daqui. É o meu sonho. Quando você fica
assim [com uma deficiência], acabou".
Adultos com deficiência tinham pouca ou nenhuma privacidade em 12 das instituições
visitadas. Cerca de 30 pessoas viviam em grandes alas ou quartos com camas colocadas
lado a lado, sem uma cortina ou qualquer outra separação. Algumas instituições tinham
salas menores, com um número menor de pessoas, mas também com privacidade
limitada.
A maioria dos adultos e crianças com deficiência tinha poucos itens pessoais, ou
nenhum, e, em alguns casos, eram forçados a compartilhar roupas – em um caso até
mesmo escovas de dentes – com outras pessoas da instituição.
Em uma instituição, os
funcionários não forneciam absorventes higiênicos às mulheres durante o período
menstrual, e sim fraldas. Funcionários de várias instituições não auxiliavam alguns
adultos a se vestirem totalmente, de modo que os adultos usavam apenas camisas ou
blusas e fraldas.
A Human Rights Watch constatou que as condições e o tratamento
oferecido eram particularmente ruins nas instituições visitadas que abrigavam um grande
número de pessoas com necessidade de apoio intensivo. As condições e o tratamento
eram desumanos e degradantes em algumas instituições para pessoas com deficiência
visitadas pela Human Rights Watch no Brasil.
Embora a legislação brasileira determine que a institucionalização de crianças não deva
durar mais do que 18 meses, salvo comprovada necessidade fundamentada por
autoridade judicial, muitas crianças com deficiência são colocadas em instituições por
períodos muito mais extensos. Na maior parte das instituições visitadas, funcionários
contaram à Human Rights Watch que a maioria das crianças tinha pelo menos um dos pais
vivos. Muitas crianças com deficiência perdem contato com suas famílias e permanecem
segregadas em instituições durante toda a sua vida. Em uma instituição, por exemplo, todos os 51 residentes estavam lá desde que eram crianças. Vários residentes tinham
mais de 50 anos de idade. O diretor de uma instituição em São Paulo nos disse: “Eles
ficam até morrer”.
Segundo dados da Secretaria Nacional de Assistência Social, vinculada ao Ministério do
Desenvolvimento Social, até 2016 havia 5.078 crianças com deficiência vivendo em
instituições no Brasil. Este número provavelmente não reflete o número real, pois os
dados são obtidos por meio de questionário preenchido pelas próprias instituições, sem
posterior checagem ou supervisão por autoridade competente. De acordo com a mesma
base de dados, 5.037 adultos com deficiência viviam em instituições.
Leiam o Relatório Completo neste LINK:
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