sexta-feira, 20 de novembro de 2015

INCLUSÃO, RACISMO E DIFERENÇA

Fonte: http://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/05/inclusao-racismo-e-diferenca.html

INCLUSÃO, RACISMO E DIFERENÇA


imagem publicada - um cartaz da Unicef que é parte da campanha contra o Racismo nas Escolas. Ele traz a imagem de uma jovem menina negra, tendo escrito ao lado: "Quézia Silva, aos 29 anos, advogada e o futuro todo pela frente", ela tem os cabelos à moda rastafari, bem negros e um olhar que confirma a frase abaixo: "Em um mundo de diferenças enxergue a igualdade", e solicita o acesso e participação desta campanha em: www.unicef.org.br.

"Era uma vez...", na antiga Iugoslávia, entre tiros reais e dentro da Terra de Ninguém de uma guerra entre sérvios e croatas estabeleceu-se uma comunicação, quase surreal, via rádio, de dentro destas trincheiras. O diálogo, segundo artigo de Kathryn Woodward (sobre aspectos téoricos e conceituais sobre Identidade e Diferença) são um exemplo magnífico de nossas construções de identidade sustentadas pela exclusão do Outro. Nessas conversas de trincheira ficava claro, no meio da escuridão do conflito étnico-racial, que todos estavam perdidos na mesma escuridão.

Assim falavam os que guerreavam pertencentes a uma pequena cidade, segundo a autora, sobre uma história do radialista Michael Ignatieff: "... Todos mundo conhece todo mundo, eles foram, todos, à escola juntos; antes da guerra trabalhavam na mesma oficina; namoravam as mesmas garotas. Toda a noite, eles se comunicam pelo rádio "faixa do cidadão" e trocam insultos - tratando-se por seus respectivos nomes. Depois saem dali para tentar se matar uns aos outros...". O radialista indaga, por não conseguir distinguir entre os sérvios dos croatas: "O que faz vocês pensarem que são diferentes?"

Eis a pergunta que poderíamos ter feito ao jovem Welligton, após sua triste matança na escola onde estudou, caso ele tivesse sobrevivido à sua guerra particular. Mas também é uma pergunta indispensável para que nos façamos agora, nesse momento, quando comemoramos uma histórica data. O que fez pensarem, aos colonialistas, que havia seres que não eram seres. Por essa razão ocidental e eurocêntrica eles foram tratados com ''diferentes'', e por uma longa jornada na História, escravizados, açoitados, torturados e mortos.

O que fez, eugenicamente, pensar que os negros eram de uma outra espécie?. Uma categoria sub-humana e, portanto, uma sub-raça que poderiam colocar no tronco, no pelourinho e na senzala. E depois nos "libertarem" pela metade com uma alforria comprada.

Imaginemos uma outra trans-história, ou melhor "estória", onde os habitantes de uma pequena vila chamada Palmares, situada em um imaginário estado separatista de Saint Paul, na fronteira com Higienópolis. Lá, uma guerra pela diferença social esportista e espartana, faz com que os territorialistas palmeirenses estejam em conflito com os quilombolas corintios. Neste diálogo real vivenciado por Michael, lá na Iugoslávia, substituimos os personagens reais da Sérvia e da Croácia por nossos concidadãos armados e intolerantes. Eles e elas são habitantes comuns e não skinheads radicais.

Teremos, então, o seguinte diálogo, ou seja um metadiálogo: "O soldado coríntio (croata) com o qual estou falando pega um maço de cigarros, feitos em palha e fumo de rolo. '-Vê isto? São cigarros verdes (sérvios) . Do outro lado da trincheira e do estádio, eles fumam cigarros palmeirenses". Ignatieff, agora um brasilguaio chamado Marciano, sentindo-se um ET, indagará: " Mas não são, ambos, cigarros?". 'Vocês estrangeiros e intelectuais não entendem nada' - o soldado coríntio dá os ombros e começa a limpar o seu rifle AR 15 (versão latina da metralhadora Zostoco).

Mas a pergunta do brasilguaio o incomoda, e após alguns silenciosos minutos na trincheira entre Higienópolis e a Zona Leste, ele deposita o rifle em um canto e diz:"Olha , a coisa é assim . Aqueles palmeirenses (sérvios) pensam que são melhores que nós (croatas). Eles (nós) pensam (os) que são europeus finos e tudo mais. Vou lhe dizer uma coisa. Somos todos lixo de Itaquaquecetubas (dos Balcãs)".

Hoje, 13 de maio, data comemorativa da Abolição ouso invocar a Potência Zumbi para desafiar o Capitão do Mato Bolsonada para que me prove a diferença que justificará sua resposta racista a uma indagação sobre a ''miscigenação" no seio de sua eugênica família ariana. E sei que mais um panfleto ou bravata, tipica de quem como ele, acredita que a menor diferença de hábitos, escolhas ou modos de viver, por si só, já justificam a sua exclusão ou extermínio.

Na essência dos temores dos muitos capitães de mato, herdeiros dos Anos de Chumbo, na Terra Brasilis, ainda circulam os mesmos princípios fascistas que circularam nos nossos vizinhos torturadores, para além das semelhanças, dos que frequentaram a Escola da Armada em Buenos Aires. A diferença é que lá na Argentina eles vão para o banco dos réus.

Por isso os sérvios e croatas tiveram e terão de passar a limpo os genocídios cometidos em nome dos "narcisismos das pequenas diferenças", como a marca ou tipo de cigarros que do outro lado são fumados. Na fumaça de seus cachimbos de boca torta sai um pouco de seus ódios étnicos e raciais. Os capitães, coronéis e generais dos campos de exceção não podem ser esquecidos, muito menos impunes.

Mas para além de combater o esquecimento e reforçar nossas memórias é preciso ir em busca de soluções para nossas pequenas guerras particulares ou coletivas. Não podemos continuar estimulando processos de segregação, discriminação ou de exclusão, seja nos bancos de escola ou nos espaços sociais coletivizados.

Entra aí a necessidade de um estímulo ao re-conhecimento das diferenças, sem negar as identidades culturais, buscando a convivência criativa com todas as diversidades, entra em ação, por exemplo, uma educação baseada em direitos humanos e de projeto/processo inclusivo.

Entre 13 de maio e 20 de novembro temos uma data esquecida: 16 de novembro. Uma data ainda fora do calendário escolar. Esta é data internacional para a Tolerância, promulgada pela ONU em Paris (1995). Entretanto, sabemos que a Tolerância é um desejo universalista ainda distante da erradicação das formações de novos ódios raciais/étnicos ou de cunho fundamentalista no mundo hipercapitalista. Tolerar, apesar do sentido etimológico de sofrimentos, é também a possibilidade de ir além das nossas mesquinharias narcisisticas.

O seu Artigo 26 : "A educação deve promover a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações, grupos raciais e religiosos" , precisa de consolidação por ações micro e macropolíticas que possam produzir novas subjetividades, novas identidades. Precisam de um re-conhecimento da urgência de uma educação anti-racista, anti-xenófoba, anti-homofobias, anti-fascista, anti-machismos, anti-escravidão no trabalho, anti-pedofilias, anti-imperialistas, enfim anti-homogeneização das diferenças.

Vamos, então, fazer um tratado, um pacto na Terra de Ninguém, aquela fronteira entre Eugenianópolis e Espartonópolis. Vamos dar o primeiro passo para que a inclusão, através do ato de educar ao Outro e si próprio, seja o melhor antídoto para o veneno do Ovo da Serpente de Vidas Nuas que habita o âmago de nossos corpos em serialização e controle biopolítico.

Mesmo sendo um antitabagista, convicto e militante, lhes pergunto: qual é a marca (estigma) da fumaça que sai de seus cigarros, cachimbos ou cigarros, sejam eles reais ou imaginários?


copyright jorgemarciopereiradeandrade (favor citar o Autor e as referências no texto em republicações livres pela Internet e veículos de comunicação de massa)

Referências bibliográficas no texto:

- Identidade e Diferença: uma introdução teórica e conceitual - Kathryn Woodward - in Identidade e Diferença - a perspectiva dos Estudos Culturais, Tomaz Tadeu da Silva (Org.) , Editora Vozes, Petrópolis, RJ, 2000.

Indicações para Leitura e utilização para reflexão sobre o Racismo:

Superando o Racismo na Escola - Kabengele Munanga (org.) - Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005.
Discriminação Racial nas Escolas (entre a Lei e as práticas sociais) - Hédio Silva Jr., UNESCO, Brasília, 2002.
-Tornar-se Negro - Neusa Santos Sousa - Ed. Graal, Rio de Janeiro, RJ, 1983
Racismos e Anti-racismos no Brasil - Ed. Pallas, Rio de Janeiro, RJ, 2001.
Raça Pura (uma história da Eugenia no Brasil e no mundo) - Pietra Diwan, Ed. Contexto, São Paulo, SP, 2007.

13 de maio - Data comemora a assinatura da Lei Áurea
http://educacao.uol.com.br/datas-comemorativas/ult1688u11.jhtm

Dia Internacional da Tolerância - 16 de novembro
http://pt.wikipedia.org/wiki/Dia_Internacional_para_a_Toler%C3%A2ncia

Dia da Consciência Negra - Dia de Zumbi dos Palmares - 20 de Novembro
http://pt.wikipedia.org/wiki/Dia_da_Consci%C3%AAncia_Negra

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QUAL É A SUA RAÇA?
http://infoativodefnet.blogspot.com/2010/11/imagem-publicada-uma-foto-em-preto-e.html

01 NEGRO+ 01 DOWN + 01 POETA - Um dia para não esquecer de incluir -
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