quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Vergonha nacional!!!

Denunciando o desrespeito ao direito constitucional de acesso à informação e comunicação.
Rede Saci - 26/11/2008

Os direitos são garantidos também às pessoas com deficiência.
Francisco Lima
Sou Francisco J. Lima, RG 14 246 913 0, CPF, 073 941 158 60 , professor adjunto da Universidade Federal de Pernambuco, pessoa com deficiência visual, conforme definido por lei e pai de um garoto de 12 anos, também com deficiência visual (Dec. 5296/04).
Falo, pois, como cidadão e pai, ao denunciar o descumprimento vergonhoso do direito à comunicação, portanto, também à educação, à cultura e ao lazer, direitos constitucionalmente garantidos a todos, mas aviltados pelas TVs às pessoas com deficiência (mormente às com deficiência visual), quando as tvs não oferecem, a essas pessoas, acesso adequado aos programas que por elas são veiculados.

Com efeito, os programas televisivos voltados à saúde e à educação, muitos deles patrocinados pelos governos Estaduais, Municipais e Federal, ao não ofertarem a áudio-descrição ou a legendagem, excluem as pessoas com deficiência sensorial (pessoas cegas e surdas), discriminando-as por razão de deficiência (lei 3.2956/01).

Reporto-me a esses programas em particular, porque é tendo a áudio-descrição de como fazer uso do preservativo, por exemplo, que um jovem saberá fazer uso desse quesito de segurança para sua saúde e de seu parceiro ou parceira. Sem ninguém que lhe descreva o que está sendo mostrado na tv, como pode ele saber?

A literatura aponta para o fato de que as informações não chegam com acessiblidade (logo não chegam) aos indivíduos com deficiência. Isso porque, programas educativos, como o Telecurso, não tendo áudio-descrição, limitam a participação de pessoas com deficiência visual, talvez as que mais precisem desse recurso de uso/acesso "doméstico", já que não podem ir à escola, por vezes, em decorrência da própria falta de acessibilidade física ou nos meios de transporte até a instituição educacional.

No entanto, não venho denunciar as tvs pela falta de acessibilidade comunicacional, apenas como pai e pessoa com deficiência:

Faço-o como estudioso da área da educação inclusiva, como pesquisador na área da psicofísica sensorial, voltado ao estudo da capacidade de a pessoa com deficiência visual fazer uso e beneficiar-se das configurações imagéticas, por exemplo daquelas advindas dos desenhos ou das imagens disponíveis em programas televisivos e faço como consumidor dos produtos e serviço televisivos.

A falta da áudio-descrição não permite à pessoa cega ampliar seu conhecimento dos eventos anunciados na TV; impede melhor acesso à conteúdos informativos e de lazer; dificulta a aprendizagem dos conteúdos educacionais veiculados nos programas; limita a compreensão do que está sendo mostrado etc.

Em outro diapasão, sendo feita a áudio-descrição, a pessoa com deficiência visual tem acessibilidade a tudo isso e muito mais, sendo, em última instância, respeitada em seu direito de consumidor.

Quando uma pessoa com deficiência visual, uma pessoa cega, por exemplo, compra um produto, paga pela propaganda que a empresa veicula na TV., muito embora ela não tenha acesso ao que ali está sendo mostrado e que não tem áudio-descrição.

Quando uma pessoa surda compra um produto, ela paga pelo comercial, incluindo o locutor, a trilha sonora e tudo que vem na forma de efeito auditivo, muito embora não tenha acesso a essas informações, por falta da legenda oculta.

Quando uma pessoa com deficiência sensorial compra um produto, portanto, ela paga por ele; logo, para que seja respeitada como consumidora ela precisa ter suas necessidades de "consumidor com deficiência" respeitadas, tanto quanto ocorre com os demais consumidores.
Estariam as empresas dispostas a descontar dos produtos comprados pelas pessoas com deficiência, os valores que compõem o preço final de seus produtos, posto que as tvs não respeitam a todos seus clientes/consumidores com igualdade de condições de acesso à informação pertinente ao produto vendido?

Não, não estariam! Nem estariam, nem isso seria de fácil aplicabilidade, uma vez que a composição do preço final do serviço e/ou produto integra o gasto com a produção e divulgação dessa publicidade.
Mas, porque, então, apenas as pessoas com deficiência devem ter de pagar pelo serviço que não vão receber?
Quando a áudio-descrição e a legendagem são oferecidas, elas incluem a pessoa sem deficiência, isto é, uma pessoa vidente poderá ter acesso à informação de um dado programa, ainda que não possa olhar para ele, como quando está dirigindo. Neste caso, o DVD que estiver sendo passado no aparelho no carro será, para o motorista, como uma "rádio novela"; um comercial em que, além das imagens, as informações escritas são as únicas coisas sendo apresentadas, será para um indivíduo analfabeto o "locutor do rádio que a ele leva a informação que não pode ler.
Como se vê, com a áudio-descrição se amplia o acesso da pessoa vidente, podendo ela escolher se acessa ou não esse recurso. Já para a pessoa com deficiência visual, não se trata de escolha: sem a áudio-descrição, ela tem seu direito à informação desrespeitado, sua dignidade é aviltada e seu reconhecimento como consumidor denegado.
Senhores, como mensageiros de minha denúncia e de meus mais veementes protestos, transmitam aos Membros de Nosso Congresso os meus mais sonoros brados pelo respeito à nossa Carta Maior, pelos cidadãos que os elegeram e pela ética e moral que devem ser a base da decisão deles, a qual, neste caso, deve ser pela anulação da Portaria 661 que caiu sobre as pessoas com deficiência como a verdadeira 666.

Então, como repúdio à Portaria 661, solicito aos senhores que envidem esforços para que seja restituído o direito de as pessoas com deficiência terem acesso às informações, aos conteúdos educacionais, culturais e de lazer nas televisões brasileiras.

Somos todos brasileiros e é aqui que devemos resolver as questões de direitos humanos que alguns teimam em denegar.
"Vale ressaltar que nem todas as pessoas com deficiência estão passivas à espera de ajuda e não estão excluídas por decisão própria ou mesmo por falta de decisão pessoal, como se não tivessem que exercer um enorme esforço simplesmente para seguir vivendo num sistema inflexível, incapaz de reconhecer o valor de habilidades incomuns e da diferença."

Reconhecido isso, portanto, as pessoas com deficiência, certamente recorrerão ao Decreto Legislativo 186/08 e seu protocolo facultativo para fazer valer o seu direito à informação, isto é, à comunicação, à áudio-descrição e à legenda oculta, caso tal não seja respeitado.
Cordialmente,
Francisco Lima

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